“O Brasil está sempre entre os cinco ou seis principais mercados do mundo para a marca”, diz Rodrigo Pesoa, VP da América Latina na Dassault

Comemorando os 60 anos da Dassault, Rodrigo Pesoa, VP da América Latina, fala sobre os avanços do mercado de aviões executivos ao longo das décadas

Rodrigo Pesoa (Foto: Divulgação)

Mesmo para aqueles mais alheios ao universo da aviação, conhecer o interior de um Falcon é uma experiência marcante. Capazes de fazer voos de longas distâncias sem escala, os aviões executivos da companhia francesa Dassault são verdadeiras mansões voadoras. Eles possuem camas, sofás, chuveiros, televisão e até pequenas cozinhas para refeições completas. A única diferença de uma casa tradicional – sempre bom ressaltar – é que se está acima das nuvens e em alta velocidade.  

 

De qualquer forma, apenas conhecer esse espaço, mesmo sem estar presente durante um voo, já é uma experiência interessante. Isso explica o sucesso da Labace 2023, um dos maiores eventos de aviação executiva da América Latina, que aconteceu no mês de julho, em Congonhas, São Paulo. Em uma feira com diversas marcas que são referência nesse mercado, apaixonados pela aviação formavam filas para ver de perto os exemplares em exposição.  

 

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Foi em meio a essa movimentação que a Versatille conheceu o interior de um Falcon e teve a oportunidade de conversar com Rodrigo Pesoa, VP da América Latina na Dassault. O brasileiro trabalha na companhia desde 1999, quando decidiram investir no Brasil e contratar representantes locais. No entanto, sua história com a empresa é ainda mais antiga. “Meu pai foi representante da Dassault entre os anos 1980 e 1990. Eu cresci neste universo e sempre gostei muito”, conta o executivo.  

 

Desde então, Pesoa já presenciou diversas mudanças e avanços no mercado da aviação e na trajetória da Dassault, que em 2023 completa 60 anos. Em entrevista para a Versatille, ele falou sobre suas percepções e vivências. Confira a seguir.  

 

Versatille: Tendo atuado em diversos cargos desde 1999, quais foram as principais mudanças e acontecimentos do setor nestas últimas duas décadas? 

 

Rodrigo Pesoa: Comecei como trainee e logo passei a ser gerente de vendas do Brasil. Depois, fui cuidar da América do Sul como um todo. O título mudou, mas sempre estive na área de vendas. Isso me faz ter a certeza de que a maior mudança nestes anos foi a relevância do Brasil. Já era um país importante naquela época, mas ela aumentou muito, e o número de aviões comercializados cresceu significativamente de uns anos para cá. O Brasil está sempre entre os cinco ou seis principais mercados do mundo para a Dassault.  

 

 

V: Hoje, como você enxerga a posição do Brasil em relação aos outros países da América Latina?  

 

RP: Alguns anos atrás, eu diria que o Brasil e o México disputavam como mercado de maior relevância na América Latina, mas agora o Brasil está bastante à frente. A posição geográfica favorece a venda de aviões, porque estamos muito longe de centros importantes, como Estados Unidos, Europa e Ásia. Então, não é simples para um empresário sair de São Paulo para comparecer a uma reunião em Paris, voltar para casa e no dia seguinte já precisar partir para Nova York. É possível fazer esse roteiro com voos comerciais? Sim. Mas não é confortável. Já no mercado interno, vemos clientes que passam por quatro estados brasileiros em um único dia. Isso é impossível quando se depende de voos comerciais. Sendo assim, o brasileiro tem uma cultura aeronáutica muito grande. Ele gosta de aviões e os usa como uma ferramenta de trabalho.  

 

V: De volta ao tópico dos avanços, como você enxerga as mudanças dos últimos anos em relação à tecnologia?  

 

RP: Nos aviões, as mudanças foram enormes. Quando eu entrei, tínhamos o Falcon 900 como maior avião, que fazia viagens de São Paulo a Nova York. Era um sucesso e chamava muita atenção. Isso mudou radicalmente. Hoje, nossa frota aumentou, e um avião que faz de São Paulo a Nova York começa a ser o básico nesse segmento. Atualmente, temos aviões que vão de São Paulo à Nova Zelândia. A mudança na aviação foi gigante.  

 

V: Acha que passamos por alguma mudança significativa no pós-pandemia? 

 

RP: No mundo pré-pandemia, muita gente voava de primeira classe em voos comerciais e realmente não pensava em ter um avião executivo. Depois da pandemia, essas pessoas mudaram de ideia. 2020 foi um desastre, mas em 2021 já começamos a perceber um cenário com mais compradores do que aviões disponíveis. Estava difícil viajar nessa época. Mesmo na primeira classe, você não ficava isolado e ainda tinha que lidar com as burocracias de um aeroporto lotado. A pandemia realmente mudou a cabeça das pessoas e mostrou que os aviões executivos podem oferecer o conforto necessário.  

 

V: Nesse período pandêmico, tivemos que aprender a nos comunicar a distância. Essa realidade digital impactou o mercado dos jatos executivos?  

 

RP: Principalmente no nosso meio, estar presente é fundamental. Eu viajo muito, e hoje minha constância de viagens é igual ao período pré-pandemia. No universo das vendas, faz muita diferença fazer um atendimento presencial. Tivemos que nos adaptar ao on-line quando era necessário, mas foi péssimo. Por isso, o mercado executivo voltou a viajar, e nossos dados mostram que já retornamos aos níveis pré-pandemia.  

 

V: Em sua visão, qual é o segredo para se manter relevante mesmo após 60 anos de mercado? 

 

RP: A empresa é muito grande, de uma maneira geral. Mesmo assim, ainda é majoritariamente familiar. Isso faz uma diferença enorme em relação aos concorrentes. Os clientes têm nome e sobrenome. Conhecemos suas histórias. Apesar de ser uma estrutura gigante, em determinados aspectos parece uma empresa pequena. Além disso, a tecnologia é um diferencial. Uma tecnologia que levamos da aviação militar para a civil.  

 

V: Pode falar mais sobre esse diferencial tecnológico?  

 

RP: A aviação militar sempre está um estágio à frente em tecnologia, por motivos óbvios. E nós somos os únicos que combinamos o setor militar com o civil. Os nossos aviões são produzidos lado a lado em uma fábrica em Bordeaux, na França. Os engenheiros e pilotos são os mesmos. Então, passamos muito da tecnologia dos aviões militares para os Falcon, e isso faz uma diferença gigantesca na performance. Nenhum outro lugar trabalha dessa forma.  

 

 

V: Além da tecnologia, qual é o papel do luxo e do design de ponta para as aeronaves da Dassault? 

 

RP: Não terceirizamos nada. O avião é fabricado na França e voa de lá para os Estados Unidos, onde cuidamos da parte do design interior. Todas as etapas são feitas pela Dassault. É tudo muito bem pensado, desde a arquitetura até o acabamento, que, modéstia à parte, beira a perfeição. Apesar de ser uma ferramenta de trabalho, quem investe em um avião desses não espera nada menos do que uma aeronave extremamente bem-acabada. O cliente pode escolher uma infinidade de madeiras e tecidos. Ele pode selecionar cada metalzinho colocado.  

 

V: Quais os principais projetos da Dassault atualmente?  

 

RP: Lançamos, recentemente, o Falcon 10X, o maior avião executivo de todos, que começará a ser entregue no fim de 2025. Um avião capaz de voar, sem escalas, de São Paulo à Nova Zelândia. É uma casa que voa. Realmente uma estrutura incrível. E é interessante falar que as primeiras duas vendas desse avião no mundo foram aqui no Brasil.  

 

V: E quais são os planos e metas para os próximos 60 anos de história? 

 

RP: Lançar um avião é um investimento gigantesco. Cada projeto é importante, e com certeza eles não param por aqui. Outros virão, e a Dassault certamente se prepara para estar presente por mais 60 anos – e depois mais 60, claro. E assim seguiremos (risos). 

 

por Beatriz Calais | Matéria publicada na edição 132 da Versatille