Luna Buschinelli: conheça a artista que fez a capa da edição 116 da Versatille

A obra que estampa esta edição foi doada por ela a convite da revista e será leiloada pela ONG Gerando Falcões

TALENTO por Raquel Drehmer | Fotos Fernando Moraes | Matéria publicada na edição 116 da revista Versatille

 

Ela tinha apenas 15 anos, em 2012, quando ficou sabendo que dois de seus artistas favoritos estavam pintando perto de sua casa, em São Paulo. Apesar de tímida, respirou fundo, selecionou dois trabalhos que havia criado e foi tentar conhecê-los. Assim o caminho de Luna Buschinelli cruzou com OSGEMEOS, duo paulistano de renome mundial composto dos irmãos Gustavo e Otávio Pandolfo.

 

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“Fiquei lá olhando, e estava morrendo de vergonha quando tive chance de falar com os dois”, recorda-se a moça. “Mas eles foram super-receptivos e consideraram que eu tinha potencial.” Tinha mesmo. Tanto enxergaram algo especial na amostra levada pela adolescente naquele dia que mantiveram contato e fizeram a apresentação da primeira exposição individual de Luna, Vagalumes, em 2014.

 

Hoje com 23 anos, a paulistana deixou seus traços em outros lugares do mundo, como Portugal, Itália e Reino Unido, além de vários muros Brasil afora. No Rio de Janeiro, por exemplo, criou um imenso mural chamado Contos. “É o maior grafite pintado por uma mulher”, diz ela, orgulhosa. A obra tem aproximadamente 2.500 metros quadrados e ocupa as paredes externas da Escola Municipal Rivadávia Corrêa, no centro da capital fluminense.

 

Contos, Rio de Janeiro | Créditos: Luna Buschinelli

 

Realizada em 2017, retrata uma mãe analfabeta e seus três filhos. Entre as obras mais recentes, Luna fala com carinho também de Crisálida, mural com ponto de visão do Masp criado em 2019, e da intervenção realizada na Rua Maestro Cardim, na Bela Vista, durante a pandemia de covid-19.

 

Essa última homenageia todos os profissionais de saúde da linha de frente do combate à doença e procura levar um pouco de conforto visual a quem passa pelo centro de São Paulo. E, claro, da tela Éris, que estampa a capa deste exemplar que você tem em mãos. É parte do díptico Éris e Tristan (nanquim, aquarela e folha de ouro 18 quilates sobre papel Fabriano) e tem dimensão de 50 x 36 cm.

 

“Levei mais de um ano para terminar, porque precisei digerir pouco a pouco esse trabalho”, conta. “As feições, os gestos, tudo é inspirado nos santos renascentistas. Em síntese, quis trazer a questão do sagrado feminino. A ideia de que Deus poderia – por que não? – ser uma mulher.”

 

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A impressão FineArt de Éris em papel de bambu e algodão (Hahnemühle) ganhou 25 prints. Dez desses terão interferência da artista e cinco serão leiloados pela ONG Gerando Falcões, de Edu Lyra. Os outros cinco, assim como aqueles sem interferência, ficarão à venda na Galeria ArtEEdições, de Claudia Marchetti, que apresentou Luna à revista.

 

“Fiquei muito feliz quando soube que ela estava fazendo essa ponte. É uma honra ser capa da VERSATILLE e, ao mesmo tempo, ajudar a sociedade”, diz Luna. “O trabalho do Gerando Falcões é essencial para o Brasil. Acho incrível o Edu permitir que a arte contribua de maneira concreta. Eu me sinto realmente honrada com essa colaboração.”

 

Arte e as redes sociais

A complexidade de consciente versus inconsciente, a persona artista versus a pessoa da vida real, as cores exuberantes de Trancoso (Bahia) versus o cinza de São Paulo: os principais combustíveis da arte de Luna são opostos que se complementam e se traduzem em suas criações, que, além da visibilidade inerente ao grafite de grandes proporções, teve seu alcance amplificado graças à Internet.

 

Expoente de uma geração quase que 100% conectada, Luna naturalmente faz bom uso das redes sociais também para fins profissionais. O Instagram é sua plataforma favorita – está lá como @lunabuschinelli – e foi nele que seu trabalho ganhou notoriedade com um público maior. No momento em que sentia uma necessidade de transição da street art para a arte contemporânea, em 2017, seus seguidores atuaram como parceiros de processo. “Sempre tive muita sede de crescimento. O grafite é minha primeira paixão, mas eu estava desenvolvendo muita técnica e pouca poética”, explica.

 

Para uma leitora ávida de Machado de Assis e Aluísio Azevedo, a falta de lirismo realmente é um problema. Por isso, decidiu dedicar-se a uma série de ilustrações sob o título Sentimentos, e quem sugeria as emoções a serem desenhadas diariamente eram os seguidores.

 

 

A paulistana do bairro do Paraíso, atualmente moradora de Perdizes, diz que não se tornou artista – que nasceu artista. E conseguiu fazer esse dom aflorar devido à personalidade inibida. “Pintar sempre foi minha forma de expressão, porque eu era uma criança muito tímida”, conta. O desenho infantil aos poucos amadureceu e encontrou forma nos muros da capital paulista, como ela conta: “Na adolescência, mudei com minha família para a Vila Madalena, e, ao andar pelas ruas e pelos famosos becos do bairro, como o Beco do Batman, senti o grafite me chamando. Ele é um grito de urgência por cores em metrópoles como São Paulo, Nova York, Barcelona e tantas outras pelo mundo, e isso me fascinou”. Aí entra a influência de Trancoso, cidade de seu pai, onde Luna viveu por dois anos no início da infância.

 

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Para aperfeiçoar seu trabalho cada vez mais, cursa a faculdade de artes visuais na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), em São Paulo, e se aprofunda em assuntos relacionados a literatura, cinema e o que mais despertar seu interesse em grupos de estudos independentes. “A arte é meu motivo para aprender e me tornar um ser humano cada vez melhor. Sem a arte, eu não teria a visão de mundo e os amigos que tenho. Devo tudo à arte e estudo constantemente para poder retribuir à altura.”

 

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