“Jamais tentei ser algo que não sou”, diz Róisín Murphy, capa da edição de aniversário da Versatille

A singularidade da cantora pop vai além dos palcos: está em sua essência, na forma como trabalha e se apresenta para o mundo

Foto: Nicolas Wagner

A cantora irlandesa nunca quis encaixar-se na logística comercial nem se adaptar ao que estavam todos fazendo. Mesmo assim, construiu sua carreira de forma única, conquistando o público por meio de sua essência, criatividade e, claro, suas músicas. Após 2005, quando rompeu a dupla Moloko, trilhou seu caminho-solo. Está sempre em busca de criativos para desenvolver discos – o mais recente deles, Hit Parade, concluído neste ano, foi idealizado com o DJ Koze num processo de seis anos. Prestes a desembarcar na cidade de São Paulo para duas apresentações, Róisín Murphy é a capa da edição de aniversário da Versatille e estampa o editorial das próximas páginas, com fotos feitas em Ibiza, a ilha espanhola que elegeu como lar.  

 

 

Confira, na sequência, o bate-papo.  

 

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Versatille: Observando tudo o que já fez em sua carreira, quando começou e até agora, eu sinto que você é superoriginal. O que acredita ser o segredo para manter-se verdadeira consigo? 

Róisín Murphy: Eu sinto que eu tenho muita ajuda das pessoas que estão à minha volta, essas “criaturas” que escolho para serem minhas amigas e meus colaboradores. Construo o meu network com pessoas ao meu redor. Por tudo o que tenho por perto e como eu cresci, nunca foi uma opção me tornar uma pessoa industrializada e muito comercial. Também nunca foi uma questão do que queria nem a minha busca. Jamais tentei ser algo que não sou, e tenho essas pessoas ao meu redor, que são pensadores autênticos. Elas me intrigam e me levam a novos lugares. Sou sempre muito guiada pelas pessoas com quem trabalho e sou muito paciente com elas, porque escolho esse tipo diferente de parceira. É necessária muita paciência, porque elas tentam achar alguma coisa que ainda não está lá. Eu estou numa jornada, junto com elas, de forma criativa. A minha carreira é a minha vida.  

 

 

V: Você consegue manter uma rotina? 

RM: Quando você tem crianças ao seu redor, é preciso acordar cedo, porque elas têm escola, por exemplo. Eu tenho uma rotina esporádica, que é diferente quando eu estou em uma turnê e quando estou em casa. Eu tenho que ser flexível. Mas gosto de acordar cedo e trabalhar em horário convencional.  

 

V: Como mantém sua criatividade florescendo? 

RM: Pela curiosidade, eu acho que eu estou sempre elegendo alguma coisa e me tornando superfanática por alguns assuntos, pesquiso coisas, tenho algumas fases assim. Fico obcecada por algo, e isso vai para meu trabalho. 

 

 

V: Essa curiosidade, assim como alguns temas, sempre foi presente em seus trabalhos? 

RM: Algumas coisas sim. Se você escutar o primeiro álbum que fiz com o Moloko, tem uma questão eterna do círculo de curiosidade que estamos, como humanos. Quanto mais você sabe, menos você sabe, afinal.  

 

V: Sobre seu último disco, que levou seis anos para ficar pronto, qual foi o processo? 

RM: Foi muito eu sozinha e muito privado. Algumas vezes em Londres, outras vezes aqui [em Ibiza], mas em grande parte em Londres, eu e meu laptop. Eu enviava os materiais para o Stefan [Kozala, mais conhecido como DJ Koze], que estava em Hamburgo. Foi uma forma de fazer um disco como ele me disse no começo, que faríamos no tempo dele, no espaço dele, e que eu teria que aprender a usar os programas que ele usa, para compartilhar os arquivos de forma remota. E eu aceitei, porque tudo o que ele me mandava era incrível. Foi bem esporádico o processo, não trabalhamos de forma intensa por alguns dias. Mas nem por isso deixou de ser um íntimo.  

 

 

V: Você está prestes a vir ao Brasil. Qual é sua expectativa? 

RM: Eu já estive no país, mas era muito jovem, no Moloko. Agora, é diferente. Eu sei que tenho bastante fãs por aí, então estou superanimada e ansiosa por isso. Além do Primavera Sounds, farei um show-solo. 

 

V: Você gosta de brincar com as roupas? 

RM: Eu amo me fantasiar desde que sou criança. Amo Halloween, amo qualquer desculpa para me vestir. Quando era mais nova, eu não tinha nada, pegava da minha tia, que tinha algumas roupas dos anos 1960, e me vestia. Eu sempre quis ser diferente e me exibir. Isso permaneceu. Certamente, com os shows, eu gosto de ser um novo personagem para cada nova música, e, algumas vezes, dependendo do que estou usando, o palco, as luzes, tudo evidencia isso. Então, sim, é mais do que moda, ou menos do que moda. Não é a moda. É uma expressão de criatividade e de contação de histórias. Eu espero que o público veja que eu sou muito real como artista, mas, mesmo assim, estou usando esses adornos. Eu gosto de manter a individualidade e a expressão própria. De alguma forma, também há uma briga acontecendo com as roupas, um eco entre a roupa sobrepondo você e você a sobrepondo.  

 

 

V: Já pensou em fazer algo além de cantar, profissionalmente? 

RM: Trabalhar com direção e escrever. Eu gostaria de fazer isso, são sonhos, mas não sei como poderiam acontecer. Escrever um roteiro, um livro, coisas que são possíveis de realizar como humana. 

 

 

texto giulianna iodice

direção criativa e edição de moda lucio fonseca

fotos nicolas wagner

assistente de foto andy davies

produção executiva lf office paris

produção kun maestre

beleza louise maxwell

unhas keely cooper

studio fuse ibiza

agradecimento isabella iannace