O que fazer em três dias de viagem pela Chapada dos Veadeiros

Mesmo com um roteiro curto, o destino oferece uma perfeita imersão pelas belezas naturais e pelos sabores do cerrado brasileiro

Cachoeira do Complexo do Macaco (Foto: Divulgação)

A Chapada dos Veadeiros, em Goiás, é muito conhecida pela sua energia leve e holística. Para muitos, isso tem uma explicação mística, enquanto outros enxergam a calmaria como reflexo da intensa natureza local. Em ambas as hipóteses, o destino promete impactar positivamente o humor de seus visitantes. Na minha experiência, o bem-estar foi chegando aos poucos, em cada quilômetro de estrada percorrido. Um processo que durou cerca de três horas em uma viagem de carro que partiu de Brasília – cidade com o aeroporto mais próximo.  

 

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Uma vez na capital do Brasil, o método mais popular, econômico e confortável para chegar à Chapada é alugando um carro. Porém, para aqueles que não possuem carteira de motorista ou têm medo de dirigir, há duas opções para chegar à região: encontrar uma boa passagem de ônibus ou contratar um transfer local – a maioria deles em estilo de carro compartilhado. Possibilidades válidas, mas que acabam sendo mais caras ou menos confortáveis que o aluguel de um carro privativo. 

 

Seja qual for o meio de transporte, vale a pena. E isso ficou ainda mais claro durante uma parada estratégica na estrada, já no distrito de São Gabriel de Goiás. Conhecida pelos viajantes de passagem, a Vó Belmira Pamonharia é uma casa famosa pelos derivados de milho, mas que também possui outros quitutes que chamam atenção. A empada de carne de sol foi a mais recheada e saborosa que já provei na vida. E foi assim que a energia do cerrado começou a fazer efeito em mim: me ganhando pelo estômago.  

 

Quando a paisagem muda 

 

Ao longo da estrada, foi possível observar a paisagem mudando aos poucos e dando espaço aos relevos característicos do destino. Como o nome já entrega, a Chapada dos Veadeiros possui várias formações de chapadas e chapadões (terrenos com extensas superfícies planas em regiões de serras). As fotos devem ajudar na compreensão, mas é realmente interessante avistar esses relevos em meio à vegetação baixa, típica do cerrado.  

 

Catarata dos Couros (Foto: Divulgação)

 

Um cenário que se estende pelos quilômetros rodados e parece seguir infinitamente. Isso porque o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, criado em 1961, é uma unidade de conservação brasileira que protege uma área aproximada de 240 mil hectares. Atualmente, sua administração está a cargo do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Extenso, o parque engloba alguns municípios, mas os mais procurados pelos turistas são: Alto Paraíso, Cavalcante e São Jorge – sendo Alto Paraíso a cidade com mais variedade de pousadas e restaurantes.  

 

Minha parada final foi em Alto Paraíso. Era domingo, próximo à hora do almoço, mas grande parte dos estabelecimentos permanecia fechada. Por sorte, o Lobo Guará Bistrô Autoral estava abrindo as portas. A empada da estrada já tinha me preparado um pouco, mas foi durante essa refeição que ficou claro quanto a comida seria um diferencial do destino.  

 

 

O pedido foi o To Share Meat, uma panelinha com arroz cremoso, carne de sol e queijo de minas, gratinado com parmesão. Perfeito para servir até três pessoas, o prato representa muito bem a comida que conhecemos na região: simples, mas com um tempero que abraço o estômago de qualquer um. De sobremesa, uma banoffee.  

 

Hora do descanso 

 

A segunda parada do dia já foi na Vila Cerrado, uma hospedagem que foi criada durante a pandemia de Covid-19 pelo casal paulistano Melina Menghini e André Cardinali. Com o objetivo de ser um refúgio de bem-estar, o espaço apresenta acomodações em um conceito de “casas-butique”. Elas são funcionais, com cozinhas equipadas, para propiciar autonomia aos hóspedes. Além disso, o hotel não possui uma recepção tradicional.  

 

Quarto Copaíba (Divulgação)

 

Embora tenha serviço de café da manhã – que pode ser no terraço do quarto, com agendamento prévio, ou no bufê, que tem início às 7h30 –, a ideia é oferecer o máximo de privacidade. Sendo assim, não há um espaço físico de recepção. Os hóspedes recebem uma senha para acessar a propriedade e, caso precisem de algum suporte, podem acionar a equipe pelo telefone. A ajuda vem na hora, mas vale dizer que tudo é muito bem pensado para oferecer os confortos necessários: há bicicletas à disposição, guarda-chuvas, toalhas para cachoeira e repelentes, por exemplo.  

 

Ao todo, a Vila Cerrado é composta de cinco acomodações que levam nomes de plantas e frutos típicos do cerrado: copaíba, jatobá, baru, pequi e buriti. Os dois primeiros são casas maiores, que possuem uma banheira de pedra privativa e acomodam até quatro pessoas – mas também são perfeitos para um casal. Internamente, a decoração recorre a trabalhos manuais assinados por escultores e artesãos locais, como trançado de palha, cerâmica e macramê.  

 

Quarto Copaíba (Foto: Divulgação)

 

Na chegada, há um ritual de boas-vindas com escalda-pés que dá um spoiler dos serviços oferecidos pelo SPA da hospedagem, como as terapias energéticas de reiki e alinhamento dos chakras. A Chapada dos Veadeiros, em si, é um local ligado a movimentos energéticos. A região acolhe a maior placa de quartzo subterrânea do planeta – coincidentemente onde passa o Paralelo 14 (que alinha o local com a lendária cidade peruana de Machu Picchu). Para alguns, essa é uma característica que propicia movimentos de autoconhecimento. 

 

Pé na estrada  

 

Com apenas dois dias inteiros disponíveis, o roteiro precisou ser mais intenso. Alguns passeios não exigem a presença de guias, mas a contratação foi uma escolha por conta do trajeto entre os pontos de visitação. A agência ARAM, de Wilson Silva Alves e Pétalla Gonzaga, foi a escolhida para a viagem. Além da grande ajuda na locomoção, o atendimento é especial pela forma como os guias apresentam a região e contam histórias que enriquecem a experiência. O primeiro dia teve dois passeios, começando pelo famoso Vale da Lua e seguindo para a trilha do Mirante da Janela. Já o segundo foi um pouco mais longe, no município de Cavalcante, que fica a 90 quilômetros de Alto Paraíso.  

 

Vale da Lua  

 

Vale da Lua (Foto: Beatriz Calais)

 

Um dos atrativos mais famosos da região, o Vale da Lua é cinematográfico por conta de suas rochas cinzentas de relevo sinuoso que remetem à aparência do solo lunar. Pequenas cachoeiras, piscinas naturais e hidromassagens aparecem entre as formações rochosas, deixando a paisagem ainda mais fascinante. Com a presença de um guia, o passeio também fica mais interessante, já que uma pessoa local sabe exatamente quais são os melhores pontos para contemplação e fotos – além de conhecer os caminhos mais seguros ao longo da trilha.  

 

 Mirante da Janela  

 

Foto: Divulgação

Foto: Beatriz Calais

 

 

Após a visita ao Vale da Lua e um almoço reforçado no município de São Jorge, chegou a hora da trilha do Mirante da Janela. Com um trajeto de 8 quilômetros (ida e volta), o percurso é de dificuldade média para alta, mas a vista compensa. Há dois pontos de observação: o clássico Mirante da Janela, onde o encontro entre duas rochas enquadra perfeitamente a cachoeira Saltos do Rio Preto, e o trecho mais alto do percurso, que oferece uma visão de 360º do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Um ótimo local para sentar-se, assistir ao pôr do sol e recarregar as energias para a trilha da volta.  

 

Cachoeira Santa Bárbara e Candaru  

 

Foto: Beatriz Calais

 

A atração para observar as duas cachoeiras –  e tomar um belo banho gelado, claro –fica localizada no Engenho II do Quilombo Kalunga (maior quilombo remanescente do Brasil), em Cavalcante. A Cachoeira Santa Bárbara possui um tom esmeralda que chama atenção e faz com que o passeio seja um dos mais procurados na região. Já a Candaru possui um tom de verde mais escuro, mas é igualmente bela e refrescante. Como o atrativo fica em um quilombo, é preciso pagar uma taxa para ingressar e pelo serviço de guias locais. Também há um almoço servido na propriedade, com alimentos orgânicos plantados pela própria comunidade e preparados no fogão a lenha. Mandioca, milho, abóbora, pequi, frango caipira e farofa de carne-seca, acompanhados de sucos com frutas típicas da região, como mangaba, cagaita e buriti. Uma refeição caseira que representa muito bem o sabor do cerrado.  

 

De volta à realidade  

 

A viagem pela Chapada dos Veadeiros foi curta, mas no fim das contas é impossível conhecer o destino por inteiro em apenas uma visita: são mais de 100 atrativos já catalogados na região, além de muitos restaurantes e lanchonetes que não foram citados aqui, mas merecem menção (como o Guedes Açaí, em Alto Paraíso, e a Santo Cerrado Risoteria, em São Jorge). Para todos, a dica é uma só: vá pela primeira vez e, na sequência, volte mais vezes. 

 

Por Beatriz Calais | Matéria publicada na edição 134 da Versatille