O mundo é um parque de diversões: 8 dicas para viagens com crianças

Familiares e especialistas no desenvolvimento infantil dão dicas de viagem com crianças e ressaltam: não há limites na hora de escolher um destino

Gabriela e Julia Temer (Acervo pessoal)

Aos 7 anos, Julia Temer – hoje com 18 anos – viveu uma experiência que poucas pessoas adultas nem sequer sonham que seja possível. Dentro de um barquinho, navegando sobre o mar transparente da Indonésia, numa ilha vizinha a Bali, ela viajava com um marinheiro local que só sabia dizer uma frase em inglês: “Manta Point” – o que repetia durante todo o trajeto, que durou cerca de uma hora, em um mar revolto. 

 

Para Gabriela Temer e Ricardo Sombra – mais conhecido como Rico –, pais de Julia, a situação já se tornara preocupante. “Eu só pensava que, se a gente desaparecesse, ninguém ia saber onde estávamos”, recorda a mãe, entre risadas. Quando o desespero já havia tomado conta, pelo menos do coração, que batia mais forte, o marinheiro finalmente parou o barco em uma encosta e disse que a família podia entrar no mar. Eles haviam chegado ao “Manta Point”. 

 

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Quando mergulharam na água com o snorkel, os três simplesmente viram um grupo de cerca de 20 mantas – a maior espécie de raias do mundo – nadando ao lado deles. Para Julia, aquele momento era pura contradição. A fascinação e o medo estavam lado a lado, mas nada fez com que ela quisesse sair da água.

 

Acervo pessoal

 

“Ela tirava a cabeça da água e me olhava com os olhos arregalados, mas, quando eu perguntava se queria subir no barco novamente, ela dizia que não”, conta Gabriela. “Isso é viagem para criança? Parece que não, mas olha que experiência incrível. Não tem parque de diversões melhor.”

 

Existe idade para viajar? 

 

Julia em um de seus mergulhos (Acervo Pessoal)

 

Para muitas famílias, viajar com criança é sinônimo de, no sentido literal da palavra, parque de diversões ou resorts que tenham espaço recreativo. Com toda a estrutura infantil montada, é claro que esses destinos são mais óbvios na hora de planejar as férias escolares. E o pensamento não é errado, mas vale lembrar que é possível ir além dos dois estilos de viagem. A experiência de Julia na Indonésia com as raias gigantes não tinha relação nenhuma com o mundo infantil, mas não deixou de criar memórias dignas de um filme de aventura em seu consciente. 

 

Julia, que acaba de completar a maioridade legal no Brasil, tem um acervo próprio de vivências hollywoodianas. Com seus pais, ela já conheceu 40 países e viveu as experiências mais diversas do mundo – de safáris e mergulhos de pura adrenalina a passeios em museus e castelos que pareciam ter saído de um conto de fadas. “Todo lugar é viagem para criança”, ressalta Gabriela. “Até visitas a vinícolas. Imagine que bacana correr pelos vinhedos e entender que tudo aquilo vira suco de uva ou vinho? Tudo é conhecimento.” 

 

Gabriela, Julia e Rico (Acervo pessoal)

 

Criadora do blog “Juju na Trip”, Gabriela é jornalista e sempre amou conhecer lugares novos. Quando ficou grávida de Julia, ela e seu marido, que é fotógrafo, prometeram para si mesmos que não deixariam de fazer o que gostavam por conta da filha. “Ter filho é uma celebração, então queríamos criá-la no mundo, sem amarras”, revela. A primeira viagem da pequena foi com apenas 4,5 meses, para Pipa, no Rio Grande do Norte. “Nossos destinos não mudaram depois que ela nasceu. Só a forma de viajar. O planejamento era mais diurno e com mais tempo de descanso, por exemplo. Também é gostoso fazer isso. Não prejudica o passeio”, explica. 

 

Para Ana Carol Thomé, pedagoga e idealizadora do projeto Ser Criança É Natural, que incentiva o contato com a natureza para o desenvolvimento infantil, viajar com crianças, na realidade, pode deixar tudo ainda mais valioso. “Que mundo o seu filho conhece do momento em que acorda até a hora em que vai dormir? Que realidade estamos apresentando a eles?”, questiona. “Conhecer os lugares, não importa se seja no seu estado ou em outro continente, é uma forma de oferecer aprendizado natural. O conhecimento, antes de estar dentro de um livro, está no mundo.”

 

Julia Temer se aventurando no Atacama, Chile (Acervo Pessoal)

 

Foi por conta desse pensamento que Ana criou o projeto Ser Criança É Natural, em 2013, com o objetivo de oferecer formação para professores e familiares e promover experiências de diálogos com as crianças. “É na natureza que o ser humano progride em seu maior potencial. Observamos melhora no desenvolvimento motor, emocional, social e até na resolução de problemas e no senso de pertencimento. Não podemos esquecer que o ser humano, por si só, é parte da natureza”, explica a pedagoga. Em sua visão, incluir crianças e adolescentes nas viagens familiares, inclusive na hora de montar o roteiro e explicar sobre o destino, é dar autonomia para que os pequenos também se sintam parte da experiência. 

 

A família é a melhor equipe

 

A Família Schurmann no início de sua jornada pelo mundo: Wilhelm, Vilfredo, Heloísa, David e Pierre (Foto: Divulgação)

 

Quando se fala sobre viajar em família, os Schurmann provavelmente são a maior referência de como organizar tudo com maestria. Primeiros brasileiros a dar a volta ao mundo de veleiro, eles já cruzaram os três oceanos e seis continentes do planeta desde que começaram a jornada, em 1984, com três crianças a bordo: Pierre, David e Wilhelm, com 7, 10 e 15 anos, respectivamente. Em 1995, a família também adotou a neozelandesa Kat Schurmann, que navegou ao lado deles por dez anos e conheceu 19 países, até falecer devido a complicações decorrentes do vírus HIV, do qual era portadora desde seu nascimento. 

 

“Nós nunca deixamos de viajar. Mesmo antes de começarmos a velejar pelo mundo, costumávamos colocar as crianças no carro e partir para longas horas de estrada pelo Brasil ou pela América do Sul”, conta Heloísa Schurmann. “Não existe isso de não viajar por causa dos filhos. Na realidade, eu viajo por causa deles. É incrível a forma como seres tão pequenos aprendem a enxergar o mundo, com respeito pela natureza e pela diversidade de culturas e pessoas.” 

 

Os pais e a pequena Kat Schurmann (Divulgação)

 

Heloísa, que é professora, sabe bem quanto o contato com realidades diferentes impactou a vida de seus quatro filhos. “Eu sempre incluí as crianças nas viagens, fosse na hora de fazer um roteiro ou durante o passeio. Eles tinham diários onde iam marcando as descobertas de que mais gostavam, desde as notas de dinheiro de cada país até o funcionamento dos vulcões”, conta. “Eu sempre digo: a vida não é só aquilo que você aprende na escola.” 

 

Em completa concordância com Heloísa, Gabriela ressalta sua crença de que até as crianças menores, que ainda estão aprendendo a se comunicar, são impactadas por esse aprendizado. “No consciente, elas não vão lembrar das viagens que fizeram quando eram muito pequenas, mas, como Jean Piaget fala: o conhecimento é como uma cebola. Ele é feito de camadas. Nem sempre você vai lembrar da primeira, mas ela é fundamental para a construção das outras.” 

 

Foto atual da família à frente do projeto Voz dos Oceanos (Divulgação)

 

Com experiência para dar e vender, as viajantes também aproveitam para dar algumas dicas para os pais que ainda estão com receio de seguir viagem com os pequenos – seja para passeios de férias, seja para voltas ao mundo. 

 

Guia de sobrevivência infantil para viagens:

 

  1. Pesquise muito sobre o lugar que pretende conhecer. É importante saber qual a melhor época para visitar o destino e quais as possíveis dificuldades caso um imprevisto aconteça;
  2. Faça uma lista do que você vai precisar levar: remédios, kit de primeiros socorros e alimentos rápidos que acalmem a criança, como biscoitos, chocolates e frutas;
  3. Sempre tenha uma garrafinha retornável. É fácil encontrar lugares para recarregá-la e você ensina sua criança a não usar tanto plástico;
  4. Deixe sua criança carregar a própria bolsa. É importante para criar senso de responsabilidade;
  5. Leve uma troca de roupa – mesmo se a criança já for mais velha, pois acidentes acontecem – e um brinquedo para fácil distração;
  6. Junte o aprendizado das viagens com o da escola, inclusive passando possíveis atividades sobre o que elas viveram nas férias;
  7. Alugar um carrinho é uma ótima ideia para viagens que envolvem muitas andanças, mesmo se a criança já for um pouco maior;
  8. Por último, mas não menos importante, tenha paciência. Crianças ainda estão em processo de aprendizagem.

 

Por Beatriz Calais | Matéria publicada na edição 129 da Versatille

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