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Não basta ser chique: Gianvito Rossi consolidou seu lugar prezando o conforto

GRIFE por Eduardo Viveiros | Matéria publicada na edição 116 da revista Versatille

 

 

No caminho inverso da moda de passarela, o mundo da sapataria de luxo dá peso menor a quem cria antes: a importância costuma recair sobre quem faz melhor. Entre matérias-primas de primeira e silhuetas já consagradas nos pés femininos, os alvos são os detalhes quase invisíveis. Basta um ângulo mal cortado para transformar uma sandália de salto num objeto de tortura chique.

 

Foto: Divulgação

 

Foi de olho nesses critérios que Gianvito Rossi se firmou, nos últimos 15 anos, como um dos shoe designers mais falados de sua geração. O italiano, que inaugura agora sua primeira loja brasileira, no Shopping Cidade Jardim, em São Paulo, não abre grandes concessões a modismos nem exageros estéticos: ficou conhecido por desenhar para mulheres que buscam sapatos possíveis de calçar.

 

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Apesar de ser uma etiqueta relativamente nova, a trajetória é de uma vida. Seu pai e mentor é o brilhante sapateiro Sergio Rossi, morto em abril deste ano, vítima da pandemia do coronavírus. Quando Gianvito nasceu, o mestre calçadista já tinha se tornado a assinatura dos pés da moda italiana: são dele, por exemplo, os sapatos da fase de ouro da Versace, com Gianni ainda à frente. O ápice da produção e da fama de Sergio, a partir dos anos 1970, coincidiu com a infância de Gianvito, gasta dentro do ateliê que funcionava na casa da família: saltos, palmilhas e afins eram seus brinquedos.

 

Foto: Divulgação

 

A carreira-solo começou depois de 2005, quando a marca do pai foi 100% vendida para o grupo francês Kering, conglomerado de moda que abriga Gucci e Saint Laurent, entre outras marcas. Uma apresentação em Milão, seguida de collabs com o estilista Joseph Altuzarra (além, claro, do sobrenome mágico), foi o que bastou para colocar Gianvito para girar na moda e entrar no passo de fãs famosas, como Gwyneth Paltrow, Beyoncé e Diane Kruger. Da corte britânica, Kate Middleton é uma de suas embaixadoras mais fiéis: com frequência calça um par de escarpins do italiano em suas aparições públicas. Dizem os especialistas no guarda-roupa da duquesa que, só desse modelo, com salto médio, ela tem pelo menos cinco pares em cores diferentes.

 

Mas, além da bênção das celebridades e do sobrenome estrelado, a esperteza do designer é que foi o fator distinto na construção de sua fama. Sabendo que concorreria com nomes como Christian Louboutin (e suas solas vermelhas inconfundíveis) ou com os lançamentos de todas as grandes marcas de luxo (e suas necessidades de reinventar a roda da moda a cada estação), Rossi apostou suas fichas na manufatura clássica que trouxe de casa. Ele defendia que a indústria sapateira mudou para pior no fim dos anos 1990, quando as grifes expandiram e trocaram os especialistas no assunto pelas linhas de produção internas. Isso fez com que a qualidade desse lugar à quantidade e uma geração inteira de mulheres teve de se acostumar com calçados tão bonitos quanto pouco anatômicos.

 

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Continuando a história do pai, Gianvito foi na contramão: sua produção é de calçados benfeitos e com atenção à forma, um conforto à moda antiga. “É muito fácil fazer um sapato da moda. Você só precisa colocar mais e mais elementos. Difícil é construir um par simples, que seja moderno e chame atenção”, costuma dizer.

 

Foto: Divulgação

 

Simples, nesse caso, não quer dizer comum – muito menos mundano. Feitos à mão, os sapatos de Gianvito passam por um processo de 60 etapas, entre o corte do couro e o descanso na caixa. E é na matemática dos ângulos que ele se garante. Para especialistas da produção, o brilho fica por conta da engenharia no equilíbrio do cabedal alongado, que acomoda o calcanhar sem forçar o pé contra formatos não naturais, enquanto os saltos pouco exagerados respeitam a silhueta do corpo. Já segundo as especialistas do provador, costumeiramente mais hiperbólicas do que quem lida com números, calçar um Gianvito Rossi equivale a pisar no paraíso.

 

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Para o designer, o amor é pelas linhas de seus sapatos. Em qualquer oportunidade que tiver, Gianvito aparece tecendo loas à importância do desenho do que fabrica. Coisa fácil de notar: basta olhar para os modelos clássicos da oficina – seja o escarpim tradicional, o peep toe de camurça ou as rasteiras de tiras trançadas. A ideia, reforça sempre, é que seus sapatos sejam peças contemporâneas e que sobrevivam a tendências e ao tempo. “O principal é que a mulher use o sapato, e não o contrário” é um de seus motes. O outro? “Adoraria chegar ao status de um designer clássico. Quem sabe no futuro?” Um objetivo bem humilde, diriam suas fãs – e seu pai.

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