Fundadora da Negra Rosa, Rosângela Silva compartilha sua visão sobre a presença da pele negra no mercado de maquiagens e skincare

Criada em 2016, a marca já conta com um portfólio extenso de produtos que atendem as necessidades das mulheres negras

Foto: Divulgação

Quando Rosângela Silva começou a gravar vídeos com dicas de beleza para a internet, em meados de 2010, ela não tinha a mínima ideia do rumo que sua vida tomaria. No início, a ideia era produzir conteúdos que ajudassem outras mulheres em processos como a transição capilar e a busca de maquiagens assertivas para a pele negra.

 

Em certo ponto, no entanto, com mais de 300 vídeos gravados, ela sentiu que havia alcançado um limite. Era hora de dar um passo maior e criar a própria marca, desenvolvendo os produtos que sempre buscou encontrar no mercado. “Eu sou a minha primeira consumidora. Os produtos funcionam para mim e, consequentemente, para pessoas parecidas comigo. Sei quais são as minhas necessidades como mulher negra”, diz Rosângela, que criou a Negra Rosa em 2016. 

 

LEIA MAIS:

 

Hoje, o portfólio da marca – que foi adquirida recentemente pela Farmax – já é extenso, possuindo linha capilar, maquiagem e skincare. “Depois de muitos anos, o mercado já está mais atento para a importância de cartelas de cores maiores em produtos como base e corretivo, mas e o processo pré-maquiagem, por exemplo? Como tratamos esse assunto? A pele negra reluz, tem um viço natural e possui necessidades específicas que precisam ser ouvidas”, destaca. 

 

Para Rosângela, poder gerar esse espaço de escuta e entrega é uma grande honra. Em entrevista para a Versatille, ela falou sobre sua trajetória e compartilhou sua visão sobre a diversidade no mercado da beleza. Confira a conversa a seguir. 

 

Versatille: Como você se aproximou do mercado da beleza? 

Rosângela Silva: Em 2008, quando eu comecei a ter mais acesso à internet, acabei me aprofundando nesse universo da maquiagem por meio de fóruns e comunidades com outras mulheres negras. Naquela época, se você quisesse saber como um batom ficava em uma mulher de pele negra, não encontrava fotos para exemplificar. Só tinha modelos brancas. Então, começamos a trocar experiências e criar o nosso arquivo. Também foi nessa época que eu parei de usar química no cabelo e estava fazendo a transição para os meus fios naturais, algo que também compartilhava nesses fóruns. 

 

V: Também foi nessa época que você começou a criar conteúdo sobre o assunto para a internet? 

RS: Em 2010, eu resolvi criar um blog e um canal no YouTube para conseguir falar com mais mulheres. As redes sociais ainda estavam crescendo, mas eu já consumia bastante conteúdo de blogueiras americanas. Todo o processo de entender o meu cabelo foi baseado nesses conteúdos. Na época, eu nem lembrava mais como era meu cabelo natural. Me ajudou muito, então eu decidi que também queria passar a minha experiência para mulheres com vivências parecidas. 

 

V: E sempre foi um sonho ter a própria marca? 

RS: Nem passava pela minha cabeça ter uma marca (risos). Eu nasci em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e nunca sonhei com algo tão grandioso assim. Naquela época, era algo muito mais distante. Não tinha esse sonho, mas, quando ele chegou, eu agarrei. A ideia nasceu enquanto conversava com uma amiga em 2016. Pensamos em criar uma marca de beleza focada na pele negra, já que era com esse público que eu conversava diariamente. 

 

V: Como a Negra Rosa foi recebida no mercado? 

RS: Primeiro lançamos batons. Já a nossa base chegou em 2017. Foquei desde o início as cores mais retintas, que é o que o mercado costuma ver por último. Quando a base foi lançada, as pessoas realmente entenderam a Negra Rosa e começaram a questionar: como ela conseguiu trazer tons que estão funcionando para a pele negra sendo uma marca nova e pequena? Até então, o discurso de algumas empresas era a dificuldade de produção desses produtos. Na realidade, acho que não havia um real desejo de atender esse público. No fim das contas, as pessoas acabavam comprando produtos que não eram ideais para elas por serem a única opção disponível. 

 

V: Quais são os planos de expansão para a marca? 

RS: Recentemente, conseguimos lançar a nossa primeira linha de skincare, que também foi toda trabalhada ouvindo as mulheres negras e suas necessidades. O nosso sabonete esfoliante, por exemplo, tem microesferas biodegradáveis de carnaúba, o que deixa o tom do produto mais parecido com a pele negra. Também criamos um uniformizador de manchas que não gera clareamento de pele, além de um produto de controle de oleosidade que não matifica em excesso. A pele negra reluz e tem um viço natural. Quando você matifica demais, acaba deixando opaca. São detalhes tão pequenos. Só sente quem está na pele, então o plano é ampliar cada vez mais a nossa entrega. 

 

V: Quais foram as reais dificuldades enfrentadas no mercado? 

RS: A maior dificuldade é fazer as pessoas acreditarem em você. Produto para pele negra não vende? Muitas pessoas acreditam nisso, então é difícil quebrar esse bloqueio. Além disso, nunca quis ser uma marca de beleza negra que impõe padrões. Seria muito fácil pegar perfis mais aceitos pela sociedade e forçar o meu marketing neste sentido. Eu sempre quis mulheres reais, que compram os meus produtos e vão se sentir representadas pela minha marca. Não quero fingir uma coisa que não sou. 

 

V: Como foi para você assistir a tantas pessoas encontrando produtos que foram pensados para elas? 

RS: Recebi relatos de pessoas que, pela primeira vez, encontraram o seu tom de base. Pela primeira vez se sentiram confortáveis com uma maquiagem. É uma troca muito bacana, principalmente quando o contato vem de mulheres mais velhas, que viveram uma época com produtos muito escassos. Tem hora que eu paro e nem acredito que tenho uma marca de maquiagem. É motivo de muito orgulho. Fico superemocionada. 

 

Por Beatriz Calais | Matéria publicada na edição 132 da Versatille