Ano pandêmico levanta discussões sobre o que é essencial à vida
O ano de 2020 colocou em xeque a forma como levávamos a vida. Apesar da falta de respostas e do cenário incerto, alguns caminhos e tendências despontam em 2021
Difícil é a missão de responder à pergunta: “O que é essencial?”, mas acredito que todos nós, mesmo que inconscientes do processo que atravessamos, nos deparamos com esclarecimentos internos sobre o que de fato importa no ano de 2020.
LEIA MAIS
- Ornare inaugura showroom nos Hamptons, em Nova York
- Urban jungle: projetos inspiradores com plantas em diferentes ambientes da casa
- Lixo zero: o que é, como aderir e por onde começar
O essencialismo, na filosofia, se refere ao que é essencial para a existência de uma pessoa ou um objeto. Já seu conceito contemporâneo está muito mais relacionado com a administração do tempo a partir da consciência do que é de fato importante; afinal, somos apresentados a novidades o tempo inteiro. E, claro, pode ser aplicado de maneiras distintas em nossa vida. É sobre definir suas prioridades, o que é, por si só, bem subjetivo.
O Observatório de Sinais, escritório de pesquisas de tendências, apontou para o ano de 2021 um momento neoessencialista nos comportamentos, o qual revela o desejo por reducionismo, simplificação, leveza, minimalismo e praticidade. Ao que tudo indica, nossas vontades serão mais simples, o que refletirá diretamente nos hábitos de consumo.
Para exemplificar, produtos funcionais e seguros (como os tecidos antivirais, que pipocaram na velocidade da luz em 2020) tendem a ter mais quórum, assim como bens duráveis e clássicos. Atrelado ao neoessencialismo, o Observatório de Sinais segue firme em apontar a sustentabilidade como ponto fundamental e agregador de valor para qualquer marca e consumidor – em 2002, o escritório de pesquisas comunicou ao mercado pela primeira vez a importância de nos tornarmos mais sustentáveis.
Em um mundo que valoriza o essencial, salvas as exceções sempre presentes, a ostentação perde seu lugar. Como tudo na vida, abre caminho para outras maneiras de viver, de consumir e de pensar o futuro. O cenário é incerto, mas está sendo desenhado.
A obra do artista Luiz Escañuela que estampa a capa da edição 118 da Versatille é livre de interpretações e sentimentos, mas as mãos dadas remetem a um dos pontos fundamentais da vida: as relações humanas. Os laços que criamos pelo caminho e que nos moldam e, algumas vezes, até nos mudam. Sejam essas uniões familiares, humanas, amorosas, sejam indefinidas, são uma de nossas prioridades e onde depositamos parte de nosso tempo, e, por isso, é impossível dizer que não são o essencial.
LEIA MAIS
- Décor afetivo: saiba como aplicar esse conceito em casa
- Hospedagens para cuidar de si e se curar da rotina
- Armani anuncia iniciativas filantrópicas em meio à segunda onda da Covid-19
Less is more
O minimalismo despontou no século 20 e no período se referia a uma série de movimentos artísticos, culturais e científicos que tinham como base apenas o uso de elementos fundamentais para se expressar. O movimento De Stijl (1917-1930), que incluía pintores, arquitetos, escultores e designers holandeses, é um dos grandes influenciadores do que viria a ser o design minimalista, assim como a escola de Bauhaus, fundada em 1919 na Alemanha.
A Casa Schroder, primeira construção com características minimalistas, foi projetada por Gerrit Rietveld em 1924. Já a frase “Less is more”, ou “menos é mais”, do arquiteto alemão Ludwig Van der Rohe, se eternizou e segue sendo replicada e até mesmo aplicada para designar um estilo de vida.
Marie Kondo, guru da organização e do desapego do século 21, ajudou a disseminar a cultura minimalista dentro dos lares. A série documental Ordem na Casa, de 2019, antecedeu o comportamento que viria à tona no ano da pandemia. O autor americano Joshua Becker também prega em seu blog Becoming Minimalist e no livro A Casa Minimalista a máxima de ter cada vez menos para aprender a apreciar o que realmente importa.
Atualmente, o sinônimo de sofisticação é ter menos. A plataforma de tendências WGSN divulgou, em outubro de 2020, movimentos que devem pautar a mente dos consumidores e a indústria nos próximos dois anos. A tendência, batizada de “Conscious Clarity”, trata de abraçar a beleza e aproveitar as oportunidades que surgem ao se viver com menos, principalmente no momento em que as populações foram impostas a restrições. Para a WGSN, a mentalidade minimalista estará presente bem além dos hábitos de organização e na forma de viver a vida, mas também nos produtos que consumimos.
A roupa do dia a dia caminha para ser mais durável e versátil, com amplo uso dos tecidos tecnológicos. O movimento também é resultante do impacto que nossos hábitos de consumo trazem ao mundo – viver com menos está prestes a se tornar um imperativo, e não uma escolha. E, se for para consumir, que seja um produto menos prejudicial ao mundo que habitamos.
Único caminho possível
A sustentabilidade perdeu o status de algo a mais e assumiu a posição de obrigatoriedade, principalmente com a percepção de que a eclosão da pandemia também está ligada ao desequilíbrio climático e aos problemas ambientais. Ou seja, ao vivenciar uma crise global, tornou-se mais claro que as escolhas individuais são responsáveis por consequências coletivas.
Conceitos atrelados à sustentabilidade, então, ganham mais força em 2021. Um deles é o desperdício zero, baseado nos cinco “R”: refuse (recusar), reduce (reduzir), reuse (reutilizar), recicle (reciclar) e rot (decompor) e também o reducionismo. O consumidor mais consciente demandará das marcas maior atenção em todos os processos de produção, além de transparência – como é nítido no editorial com peças da ReBurberry, que você confere na página 62 e na matéria sobre práticas sustentáveis aplicadas à arquitetura, na página 126. Boa leitura!
Por Giulianna Iodice | Matéria de capa da edição 118, sobre o essencial, da Versatille