“Queremos que as mulheres tomem os alpes”, diz Corinne Genoud, do Turismo da Suíça, sobre o programa 100% Woman

Em passagem pelo Brasil, a head de mercados do ocidente falou com a Versatille sobre os projetos de incentivo a mulheres viajantes no país europeu

Foto: Divulgação

Em um café da manhã tipicamente brasileiro, com muito pão de queijo e café, Corinne Genoud, head de mercados do ocidente para o Turismo da Suíça, gerou uma reflexão inusitada aos que estavam presentes na mesa. “As montanhas são dominadas pelos homens há séculos”, destacou — e embora a afirmação pareça até um pouco cinematográfica, como se os alpes fossem um espaço tomado por um grupo específico, basta prestar atenção aos detalhes para perceber o quanto a fala de Corinne, que é suíça, é válida.  

 

Os homens são os guias, os especialistas e até mesmo o foco de algumas marcas que vendem produtos direcionados para alpinistas. Muitas vezes são eles que representam a imagem de um bom turismo nos alpes. Por mais que isso esteja em processo de mudança nos últimos anos, ainda não é tão comum ver uma mulher guiando um grupo em uma escalada ou trilha, por exemplo.  

 

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“Eu mesma sempre faço meus passeios pelas montanhas com uma guia mulher. Ela é ótima, mas raramente vejo pessoas tirando dúvidas ou pedindo informações para ela”, diz Corinne. “É como se precisássemos ser guiadas o tempo todo.”  

 

Foi pensando nessa realidade que o Turismo da Suíça Global criou, em 2021, o programa 100% Woman, que visa impulsionar o empoderamento feminino por meio de atividades ao ar livre voltadas exclusivamente para mulheres. Hoje, o país é considerado um dos mais seguros do mundo quando se trata de receber visitantes femininas, além de estar no topo dos rankings internacionais de destino sustentável. Dessa forma, o objetivo é mostrar que a Suíça está totalmente preparada para receber as viajantes que apreciam viajar sozinhas ou em grupos de mulheres.  

 

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Os primeiros dois anos do programa foram dedicados ao montanhismo, buscando mudar a realidade que Corinne expôs no início da conversa. Desde então, recordes mundiais já foram batidos e dezenas de mulheres já foram homenageadas em uma espécie de calçada da fama para aquelas que escalam as montanhas mais altas. “Evoluímos muito, mas agora o objetivo é promover outras atividades ao ar livre.” Em 2023, por exemplo, o foco é o ciclismo.  

 

Ao longo do encontro, Corinne contou mais detalhes sobre sua carreira e os planos atuais com o programa 100% Woman. Confira as melhores partes da conversa.  

 

Versatille: Como foi o seu início de carreira? Sempre pensou em trabalhar com turismo? 

 

Corinne Genoud: Eu cresci nas montanhas em uma região muito turística. Então, quando era pequena, meus amigos iam para a minha casa durante as férias. Todos os anos, amigos da França, da Bélgica e da Holanda vinham para o nosso vilarejo para aproveitar os dias de folga. Dessa forma, cresci com o turismo ao meu redor. Sempre fui imersa nesse universo. Quando cresci, passei uma temporada de um ano e meio na Islândia e logo voltei para a Suíça decidida a estudar e trabalhar nessa área de viagens. Apliquei para o Turismo da Suíça Global e eles logo me contrataram. O resto é história (risos).  

 

V: Para além do profissional, qual é o papel do turismo na sua vida pessoal? Qual o seu estilo de viagem? 

 

CG: Eu viajo, principalmente, para conhecer pessoas e novas culturas. Esse é o meu estilo. Muito simples. Também viajo com poucas malas e gosto de ir para destinos remotos, na natureza. Quando estou em algum lugar que não conheço, gosto de sentar em um café por horas e ficar apenas observando as pessoas. Vendo o que elas comem, vestem e como conversam. Não fiz isso em São Paulo ainda, infelizmente, mas é como gosto de conhecer os lugares. 

 

V: Qual você enxerga ser o seu papel como mulher em um cargo tão importante para o turismo na Suíça? 

 

CG: Quando aceitei esse cargo, jurei que nunca deixaria de ser eu mesma. Não faria nada para tentar impressionar e não tentaria me tornar a representação de um homem. Seria apenas eu, porque isso é o melhor que posso fazer. Acho que esse conhecimento vem com a idade, para ser honesta. Quando comecei a trabalhar, o mercado ainda parecia conservador. Mudou muito desde então. Agora, olhamos para trás e vemos que aquele cenário não era normal, mas é assim que a sociedade se desenvolve. Eu tomei o espaço que precisava tomar e isso tem o seu valor para mim e para outras mulheres.  

 

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V: Na sua opinião, o que faz com que hoje a Suíça seja considerada um dos países mais seguros do mundo quando se trata de receber mulheres? 

 

CG: O respeito é uma questão muito importante na Suíça. Respeitamos a privacidade e o espaço de cada um. Vemos mulheres andando sozinhas em qualquer horário na Suíça. Do início do dia até tarde da noite. Nos sentimos seguras fazendo isso. Também é uma cidade organizada onde é quase impossível se perder. Eu, por exemplo, raramente volto para casa de carro após o trabalho. Gosto de andar na rua à noite e não me sinto insegura. É assim para os locais e acaba sendo para os turistas também.  

 

V: E qual o objetivo do programa 100% Women? Como esse projeto começou?  

 

CG: O programa começou em 2021, no Dia Internacional da Mulher. Talvez não tenha sido a melhor época, mas já atrasamos um ano, visto que a ideia inicial era começar em 2020. O programa nasceu porque percebemos que a Suíça tinha um grande potencial para turistas mulheres que gostam de atividades ao ar livre, em contato com a natureza. Muitas vezes, as mulheres não se sentem acolhidas ou incentivadas a fazer esse tipo de atividade, principalmente quando estão viajando sozinhas ou sem um homem para acompanhar. Então, isso nos fez criar campanhas e criar espaços para as mulheres. 

 

V: Quais passos já foram dados neste programa desde 2021? 

 

CG: As montanhas foram nosso foco inicial. Os alpes ainda representam um ambiente conservador. São dominados pelos homens há séculos. Eu mesma sempre vou para passeios na montanha com uma mulher como guia e vejo o quanto as pessoas ficam surpresas. É como se apenas os homens soubessem informações sobre as montanhas e tivessem conhecimento sobre esse universo. Isso não nos abala, mas mostra que ainda temos um longo caminho pela frente. 

 

Queremos que as mulheres tomem as montanhas e também se sintam confortáveis para viver aventuras. E é por isso que estamos fazendo algumas campanhas de incentivo. Fizemos, por exemplo, uma espécie de calçada da fama para as mulheres que conseguem escalar as maiores montanhas da Suíça. Em 2022, também fizemos um grupo com 80 mulheres para um roteiro de escalada. Tudo guiado e formado por mulheres que sabem o que estão fazendo. Foi emocionante.  

 

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V: E quais os próximos focos?  

 

CG: Esse ano falamos bastante de ciclismo. Mulheres viajando juntas e aproveitando o ar livre e o verde da cidade com a ajuda das bicicletas. Realmente queremos dizer para as mulheres do mundo todo que elas venham para a Suíça e aproveitem a tranquilidade. Estar ao ar livre, não necessariamente nas montanhas, é fundamental. É energizante e faz com que as pessoas se reconectem. Na Suíça, você pode beber qualquer água, em qualquer lugar. A natureza cura você. Seja qual for a sua necessidade. Ela cura.  

 

V: Como a Suíça tem enxergado os turistas brasileiros? É um público muito importante para vocês? 

 

CG: Somos um pouco brasileiros na Suíça, embora muitos não percebam (risos). Gostamos de socializar e de sentar-se ao redor de mesas para conversar. Temos algumas características parecidas e os brasileiros são sempre bem-vindos. Suíça no verão é algo que os brasileiros estão começando, lentamente, a conhecer. Estamos trabalhando com essa divulgação, porque até o momento o perfil de viajantes do Brasil na Suíça tem relação com a neve e com o inverno.  

 

V: Quais são os avanços que vocês esperam para os próximos anos de projeto? 

 

CG: Queremos criar novos programas e mudar um pouco o turismo da Suíça. Já vimos resultados, mas queremos mais. Hoje, já há companhias suíças promovendo pacotes para mulheres que estão viajando em grupo. É fantástico. Queremos melhorar cada vez mais e estamos no caminho.  

 

Por Beatriz Calais

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