É difícil apontar alguém que nunca sentiu um cheiro e instantaneamente revisitou uma memória ou mudou drasticamente de humor. O responsável pela natureza afetiva das percepções sensoriais é o sistema límbico, que compreende todas as estruturas cerebrais relacionadas a comportamentos emocionais. No Brasil, sobretudo, o efeito dos aromas parece ser ainda mais valorizado: um relatório da Euromonitor International (empresa de pesquisa de mercado) de 2020 classificou o país como o segundo maior consumidor mundial de fragrâncias, atrás somente dos Estados Unidos. Além disso, foi constatado que elas fazem parte da rotina dos brasileiros por representarem 22,9% do total dos produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos consumidos.

 

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“Talvez as pessoas não saibam de forma tão técnica o que esse impacto das fragrâncias significa, mas, inconscientemente, elas têm essa experiência e usam isso no dia a dia de alguma maneira. A gente precisa valorizar o olfato, aproveitar o poder que ele tem nas nossas emoções e utilizá-lo de uma forma consciente”, diz Debora Xavier, gerente de desenvolvimento de produto da Granado.  

 

Segundo um artigo publicado em março deste ano pela WGSN, as fragrâncias estão se tornando cada vez mais funcionais e atualmente unem saúde, higiene e emoção. Além disso, a pesquisa revela que o destaque da figura do perfumista, a fim de explicar qual foi a inspiração por trás de um produto, é essencial para estabelecer uma relação mais humana entre cliente e criador.

 

Quando a tarefa é criar fragrâncias que auxiliam de fato na garantia do bem-estar físico e emocional, além de materializarem experiências, as marcas AlkhemyLab by Joel Aleixo, Granado e L’envie parfums se destacam no mercado nacional. Veja, a seguir, como cada uma delas representa os diferentes papéis que um elemento olfativo pode protagonizar. 

 

A cura

 

“Existe um conhecimento milenar sobre o poder dos óleos essenciais, mas que não era difundido. No Egito Antigo, as múmias já eram embalsamadas com eles, para ser preservadas. Com a pandemia, essa compreensão foi trazida para a contemporaneidade, já que a maioria deles tem propriedades fungicidas, antivirais e bactericidas”, diz Jackie Yue, especialista em alquimia floral e CEO da AlkhemyLab by Joel Aleixo, marca de compostos alquímicos produzidos a partir de óleos essenciais 100% puros. 

 

 

Segundo a especialista, tais substâncias são extratos originários de flores, caules ou outras áreas de uma planta. O que as diferencia de fragrâncias sintéticas e essências é a força de seus princípios ativos, garantida pela alta concentração e extração direta da natureza. “Para obter 1 litro de óleo essencial de rosa, por exemplo, são necessárias 4 toneladas de pétalas da flor”, diz Jackie. Em 2018, a AlkhemyLab foi incluída pelo Ministério da Saúde nas PICs – Práticas Integrativas Complementares – do SUS e, em maio de 2020, o Conselho Nacional de Saúde autorizou o uso da terapia floral na assistência ao combate à covid-19.

 

 

A marca não só oferece cosméticos que garantem o bem-estar físico mas também opções de aromaterapia, como difusores e borrifadores ambientais. “Os óleos essenciais se misturam com o ambiente e agem terapeuticamente. Em um local onde tem tristeza e ansiedade, se você utilizar esse spray, toda a vibração e energia serão tratadas”, explica. Alguns dos aromas que têm se destacado entre os consumidores são os de lavanda e alecrim, por conta de suas propriedades relaxantes e antibacterianas, respectivamente. Para adquirir os produtos, não é necessário indicação médica, mas é recomendado o apoio de um aromaterapeuta.

 

Duplo aliado

 

A busca pelo bem-estar em meio ao isolamento uniu uma parte da população, que adotou uma rotina de autocuidado. “Existe um perfil de pessoas que gostaram tanto dessa nova vida de curtir mais a casa e um momento introspectivo que vai continuar optando por fragrâncias que trazem uma sensação agradável de frescor, naturalidade e conforto”, explica Débora Xavier, da Granado. 

 

 

A linha Terapeutics da marca, por exemplo, oferece desde colônias, difusores e velas até sabonetes, shampoos e esfoliantes para garantir de fato um “spa em casa”. Todos os itens são produzidos a partir de plantas clássicas, como lavanda e calêndula. “Eles trazem um bem-estar porque a pessoa está com sua casa ou seu corpo com cheiro de natureza”, conclui.

 

 

Embora o ritual relaxante seja tentador, há também aqueles entusiasmados com o retorno dos encontros presenciais, buscando sensações vibrantes. “Principalmente solteiros mais jovens, que ficaram tanto tempo isolados, agora querem sair e socializar. Eles estão buscando fragrâncias mais sensuais, quentes e ousadas.” A alta procura pelo perfume Bronze, intenso e opulento, lançado recentemente na coleção de Natal da Phebo (a linha é propriedade da Granado), é uma comprovação da evidência. 

 

Uma obra de arte

 

Liberdade criativa é o que define a marca de perfumaria autoral brasileira L’envie parfums. O negócio, fundado em 2008, tem como foco a inspiração dos perfumistas Fanny Grau e Isaac Sinclair. Sem seguir tendências nem se encaixar em qualquer padrão, a marca cria fragrâncias para casa e corpo, e sua única premissa é oferecer lançamentos periódicos. “Para produzir bastante, quanto mais regras existirem, mais difícil fica surgirem resultados legais”, explica o fundador, Fábio Ottaiano. 

 

 

Os produtos da L’envie são feitos a partir de um elemento central combinado com a intuição e as experiências vividas pelos perfumistas. Para o perfume Figorativo, lançado recentemente, o projeto teve início com o figo: “A gente queria muito um perfume dessa fruta. A Fanny se inspirou então na figueira que o tio dela tinha quando ela era criança, pegando referências de sua vida, junto a essa base”, conta Ottaiano. Em outros casos, as criações partiram de cores, frascos e até na noite paulistana, como o São Paulo Is Burning.

 

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Segundo o empresário, os consumidores têm valorizado mais a unicidade das fragrâncias e se interessado pela subjetividade que envolve esse universo. “O perfumista é de fato um artista, como se fosse um músico que cria os acordes. Tem todo um trabalho que alguém está fazendo para apresentar aquilo como uma arte, uma peça inspirada, e cada vez mais as pessoas buscam entender o que os artistas que conhecem a perfumaria acham interessante”, conclui. 

 

Por Laís Campos | Matéria publicada na edição 123 da Versatille