6 perguntas para o professor e escritor Jeferson Tenório
Ganhador do Prêmio Jabuti de 2021 pelo livro O Avesso da Pele, Tenório compartilha sua trajetória e visão literária

Se você já leu alguma obra de Jeferson Tenório, dificilmente discordará da seguinte afirmação: o autor sabe, com maestria, desenvolver uma narrativa capaz de inserir o leitor na história, por mais diferente que seja a sua vivência daquela retratada no livro. O resultado é uma escrita que gera empatia, intimidade e reflexão.
Escritor, professor e pesquisador nascido no Rio de Janeiro, mas radicado em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Tenório é autor das obras O Beijo na Parede, Estela sem Deus, De Onde Eles Vêm e O Avesso da Pele – esse último ganhador do Prêmio Jabuti de 2021 na categoria Romance Literário. Em entrevista para a Versatille, ele compartilhou um pouco de sua trajetória. Leia o bate-papo a seguir.
Versatille: O que fez você começar a escrever?
Jeferson Tenório: É curioso, mas a escrita fez parte da minha vida antes da leitura. No início da adolescência eu já inventava histórias, escrevia diários e novelas. Sempre gostei. Mas foi depois de me tornar leitor que realmente comecei a escrever para valer.
V: Como a sua trajetória como professor impactou na vida de escritor?
JT: Eu falei que devo muito à literatura, mas não somente a ela. Também devo muito aos alunos. Eles me ensinaram e me fizeram duvidar das minhas certezas. Tudo isso me constituiu em alguém que observa a sociedade. Acho que o escritor é isto: alguém que presta atenção. Quando alguém que escreve entra num ônibus, talvez não esteja muito preocupado com o destino, mas sim com o que acontece no caminho. Ele aguça os ouvidos, presta atenção nas conversas e na movimentação. E ser professor me transformou nessa pessoa.
V: E como escritor, o que você busca passar com os seus livros?
JT: De modo geral, eu quero que as pessoas leiam. Antes de qualquer coisa, que elas se emocionem, se envolvam e tenham empatia ou antipatia pelos personagens. Gosto de escrever para quem talvez nunca tenha lido um livro. Eu mesmo fui esse leitor tardio, então almejo formar novos leitores.
V: Sobre O Avesso da Pele: o que você acredita que fez a narrativa impactar e gerar intimidade com tantos leitores?
JT: Primeiro, acredito que a estrutura do livro tenha impacto: uma narração em primeira pessoa, mas que chama a segunda pessoa, quase como se estivesse convocando o leitor a participar da história. Além disso, a temática aproxima. É a história de um professor, tem uma relação delicada entre pai e filho e a realidade dura do racismo e da violência policial. Esse conjunto oferece várias chaves de leitura. A pessoa pode se conectar pelo luto, pela educação, pelo racismo estrutural… uma série de portas que capta diferentes leitores.
V: Além do apoio, o livro também sofreu ataques e censura. Como você enxerga isso?
JT: Acho que o mais importante é termos em mente que proibir um livro em uma escola é inconstitucional e menospreza a inteligência dos alunos. Na literatura, parece que as pessoas têm uma ideia de mimetização, como se, ao ler uma determinada história, isso fosse influenciar os adolescentes a fazerem exatamente o que está ali. É a famosa apologia. Eu vejo isso com bastante preocupação. Começamos censurando, queimando livros, e sabemos aonde esse caminho nos leva.
V: Para você, qual a importância da leitura para um indivíduo?
JT: Ler é sempre importante. É a forma que você tem de viver outras vidas, escapar da mediocridade do próprio umbigo e perceber que não existe só você no mundo.
Por Beatriz Calais | Matéria publicada na edição 138 da Versatille