A era das supermodelos está de volta. Não exatamente nas passarelas, mas nos guarda-roupas e nas coleções inspiradas nas estrelas quando estão fora dos holofotes. Com mais de 180 milhões de visualizações no TikTok – aplicativo famoso por anunciar tendências –, o estilo model off-duty, que em tradução livre significa “modelo em dia de folga” ou “fora de serviço”, ascende com a premissa de uma moda chique minimalista “sem esforço”, ou seja, basta uma regatinha branca, um jeans e uma peça complementar para estar bem vestida.  

 

LEIA MAIS:

• Montblanc lança nova campanha global com Cillian Murphy
• 5 criações icônicas de Issey Miyake
• Tiffany & Co. lança coleção de pingentes físicos inspirados em CryptoPunks

 

Segundo Wellington Mendes, diretor criativo e professor convidado do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, especialista em imagem de moda, o termo que dá nome à estética surgiu no século 20 e se tornou popular especialmente a partir da década de 1960 por meio de Lesley Lawson – conhecida por seu nome artístico, Twiggy –, considerada a primeira top model do mundo. Todavia, foram nas décadas sequenciais aos anos 1960, especialmente em meados dos anos 1980, que o estilo ganhou ainda mais força por conta do surgimento da figura da supermodelo no contexto midiático. 

 

Mendes explica que, nessa época, as modelos eram muito emblemáticas e causavam um impacto tão grande quanto aristocratas ou mesmo estrelas de Hollywood durante os anos da era de ouro. Assim, quando faziam aparições apoteóticas principalmente fora dos sets e das passarelas, passaram a popularizar seu street style. “Para ter uma dimensão da notoriedade delas, trazendo para os dias atuais, poderíamos facilmente compará-las a celebridades de forte apelo, como as Kardashians ou grandes digital influencers, já que todas essas são responsáveis por ditar um comportamento aesthetic das novas gerações”, diz.  

 

O mais curioso desse estilo é que as roupas icônicas vestidas por essas celebridades nas passarelas não são o objeto de desejo, e sim o que vestem em seu dia a dia, fora do glamour. “O model off-duty nada mais é do que uma definição abstrata de um estilo de rua porque não há uma identidade visual única que o defina. Ao mesmo tempo, a mensagem transmitida é de algo prático, consciente, abrangente e ímpar. Ele traz à tona a figura de uma persona que é reconhecida, admirada, influente, repleta de referências e com muito repertório”, afirma.  

 

É justamente essa liberdade e admiração por personalidades notórias que têm atraído um crescente número de adeptos à estética. De um lado, há uma fácil identificação com ela, uma vez que supermodelos de diferentes nacionalidades e, consequentemente, culturas e aparências permitem a coexistência de diversas essências do estilo. De outro, a indústria musical tem papel importante na criação de celebridades fashionistas que se conectam com o público por meio da música e do visual simultaneamente. 

 

“Existe uma interação parassocial que acaba sendo unilateral e altamente emocional quando você pensa que uma pessoa comum se espelha em alguém com status de celebridade, ao mesmo tempo que há uma existência limitada ou quase nula de interação entre essas partes. No contexto atual, a cultura pop, principalmente o entrelaçamento cada vez maior entre música e moda, é um dos grandes pilares de impulsionamento da tendência”, explica. 

 

 

Outra figura de extrema importância no model off-duty são os personal stylists, uma vez que frequentemente celebridades contratam esses profissionais não só para eventos importantes, mas também para viagens, campanhas e posts nas redes sociais e até mesmo aparições casuais, pois os fotógrafos estão sempre por perto. “Normalmente, elas escolhem trabalhar com um stylist para que ele seja o responsável por sua imagem e por se identificar com a linguagem utilizada por ele. Então, basear-se no conceito impresso por ele na imagem que ele constrói também é um caminho para quem busca se vestir nesse estilo.”

 

Embora tenha um viés minimalista, são diversos os elementos de moda que podem compor o model off-duty. Em primeiro lugar, o jeans, um dos mais emblemáticos do estilo. Embora o modelo icônico tenha sido o skinny, hoje as calças cargo, wide leg e mom são as mais procuradas. No lado sofisticado, destacam-se composições de alfaiataria monocromática como blazers, smokings
e saias; vestido tubinho preto clássico, jaqueta de couro, saltos e botas. Já no casual, itens esportivos que mesclam gêneros como agasalhos masculinos, sneakers, regatas lisas e t-shirts. Há também peças com referência boho e acessórios diversos que incluem colares de pérolas e óculos escuros, entre outros. 

 

“O principal objetivo é ter à mão peças versáteis e ecléticas que funcionem como grandes curingas. Desde a proposta mais básica, quando a própria modelo, por exemplo, está pronta para um casting, até uma composição mais elaborada rumo a uma night party. Tendo essas peças curingas no look do dia a dia, o guarda-roupa consequentemente vai funcionar em qualquer circunstância e permitir composições singulares, ao mesmo tempo em um look repleto de personalidade, conforto e atemporalidade.” 

 

No que diz respeito a marcas que traduzem o model off-duty em suas coleções e posicionamentos na atualidade, é possível citar Moschino, Gucci e Balenciaga. As duas primeiras destacam-se pelas criações “repletas de criatividade, elegantes e autênticas”, como descreve Mendes. Já a Balenciaga, segundo o professor, é uma marca que consegue mobilizar extremamente os trendsetters, uma vez que mantém relacionamentos próximos com pessoas influentes. Em seu último desfile, inclusive, teve Nicole Kidman, Kim Kardashian e Dua Lipa como modelos. Já no âmbito mais comercial, as gigantes do fast fashion como Zara e H&M são representantes do estilo. 

 

De toda forma, é impossível falar de model off-duty sem citar as referências que deram vida a esse estilo. Confira, a seguir, uma linha do tempo com as principais modelos de cada época, indicadas por Mendes. 

 

Anos 1960

 

“Twiggy foi a grande it girl de sua geração. Em caráter de curiosidade, lançou até mesmo uma marca de roupas que levava seu nome, totalmente inspirada em seu estilo pessoal, possibilitando que o grande público que acompanhava sua carreira e se inspirava nela passasse a literalmente consumir seu estilo pessoal.”

 

 

Anos 1970

 

“Marisa Berenson era a queridinha de Yves Saint Laurent. Curiosamente, ela já vem de um berço de moda bastante expressivo, pois é a neta da lendária estilista Elsa Schiaparelli. Já a top model Jerry Hall, embora tenha se popularizado ainda mais como figura midiática com seu casamento com Mick Jagger, é uma mulher extremamente elegante e trendsetter nesse contexto de ditar um estilo de muito bom gosto e requinte.”  

 

 

Anos 1980: a era das supermodelos 

 

“Chegando finalmente ao que podemos considerar o ápice do model off-duty, no contexto das supermodelos, temos como exemplo Naomi Campbell, Cindy Crawford e Iman.”

 

 

Anos 1990 

 

“Kate Moss foi considerada a ‘heroína chique’ – estilo caracterizado por pele pálida, olheiras, extrema magreza, entre outros aspectos associados ao uso de heroína e diferentes drogas –, assim como a ex-modelo e hoje apresentadora Tyra Banks.”

 

 

Anos 2000

 

“Em Adriane Galisteu, que é uma figura extremamente versátil, a gente percebe a elegância quando ela se apresenta em programas de TV, mas, ao mesmo tempo, nas aparições fora das câmeras. Ela também foi modelo fotográfica, então imprime muito esse estilo desde sempre. Gisele Bündchen, por sua vez, tem uma influência bem boho em sua versão de model off-duty.” 

 

 

Atualidade  

 

Além das irmãs Gigi e Bella Hadid, Kendall Jenner e Hailey Bieber, Kaia Gerber é um dos destaques entre as modelos atuais que popularizam o model off-duty. “Ela é uma das top models mais relevantes e promissoras da nova geração e, curiosamente, filha de Cindy Crawford. Kaia é um belo exemplo de unificação entre as modas surgidas a cada estação. Ela segue tendências ao mesmo tempo que dita tendências. Só que o mais interessante é que, em seu estilo, é possível perceber a mescla entre peças vintage, que têm referências grunge – subgênero do rock alternativo que surgiu no fim da década de 1980 –, e outras mais modernas e até mesmo com um apelo glam. Em minha perspectiva, ela sintetiza muito bem esse movimento proposto pela moda e o comportamento de consumo na era do fast fashion, tão explorado pelo estilo model off-duty.”