Gérard Uféras: Behind the scenes
E ntre a última Fashion Week e o big evento da fotografia — Paris Photo (Feira Internacional da fotografia artística) —, em novembro, meu encontro, na Cidade Luz, foi com um dos grandes fotógrafos franceses
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E ntre a última Fashion Week e o big evento da fotografia — Paris Photo (Feira Internacional da fotografia artística) —, em novembro, meu encontro, na Cidade Luz, foi com um dos grandes fotógrafos franceses de moda, espetáculos e lifestyle: Gérard Uféras.
Fotojornalista com carreira brilhante, Uféras já recebeu uma série de prêmios, incluindo o World Press Photo-Artes e Entretenimento (1996). O trabalho desse instigante fotógrafo é composto por exposições, retratos, publicações para jornais, livros e revistas.
Fascinado pela coleção de máquinas fotográficas do pai, debutou nessa arte aos 8 anos. Mas foi a descoberta de Henrique Cartier-Bresson (1908- 2004) por André Kertész (1894-1985) e Willy Ronis (1910-2009), que o despertou para a fotografia como expressão artística. Gérard fala, com imenso orgulho, que hoje é um dos gestores do patrimônio cultural de Ronis, de quem se tornou grande amigo. Willy Ronis ficou famoso pelas imagens humanistas e poéticas de Paris no pós-guerra.
Em 1984, Uféras começou a trabalhar para o jornal Libération. Desde 1993, é membro da Rapho, uma das mais antigas agências de imprensa especializadas em fotografia humanista. Apaixonado pela música e pelo teatro, cruzou a Europa e aterrissou em Nova York fotografando o “behind the scenes” de óperas e ballets por 20 anos. Viveu a vida dos bailarinos no dia a dia, acompanhou as aulas de dança e assistiu às performances finais. Em 2011, recebeu carta branca do Bolshoi para fotografar e editar o livro comemorativo de reabertura do teatro com Peter Lindbergh e Sarah Moon.
Em nossa conversa em seu estúdio, ouvi inúmeras histórias da trajetória do mestre, que, também, traz no currículo o privilégio de ser o fotógrafo dos ateliês Dior. Esses registros resultaram no livro Dior 30, avenue Montaigne e desvendam a rotina criativa da Maison. O olhar apurado de Uféras surpreende pela sensibilidade com que capturou no hotel particulier de Christian Dior o espírito e a elegância que eternizaram o DNA do couturier.
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O backstage da alta-costura, do primeiro esboço de um vestido ao desfile da nova coleção, do trabalho das “petites mains” durante as provas nos manequins, do shape de uma perna longilínea à beleza refinada de uma modelo. Gérard conta que se apaixonou pelos ateliês criados por Monsieur Dior em 1946, e mergulhou nos veludos e tafetás, andando pelo meio de bustos mágicos e plissados encantadores clicando tudo minuciosamente, sempre cúmplice e sorridente. Discreto, trabalhou durante várias semanas entre aqueles que criam e moldam a moda. A alta-costura que, em geral, só é descoberta nas passarelas teve o testemunho de Uféras em todo o processo de uma coleção.
Exímio observador, enfocou toda a arte do trabalho manual, mostrando e contando a história dos tecidos, dos materiais, do brilho e do esplendor da couture.
Todo em preto e branco, marca de Gérard, Dior 30, avenue Montaigne é um legítimo must-have para a biblioteca de quem estuda, trabalha, coleciona ou, simplesmente, curte moda. Das histórias inusitadas, dos ateliês, contou que se espantou quando descobriu que os artesãos tinham cada um o seu dedal e completamente diferente um do outro. Essa história acabou se transformando em um outro livro: DÉS comme DIOR.
Das memórias inesquecíveis dos cliques do Ballet Bolshoi, disse que ficou arrasado quando chegou para fotografar os bailarinos e soube que a primeira bailarina da companhia, Svetlana Zakharova, não estaria presente porque havia acabado de dar à luz. Porém, antes de retornar a Paris, não imaginou a surpresa que estava por vir. Na retomada dos palcos por Svetlana, Uféras foi chamado e a bailarina dançou, num solo, A Morte do Cisne para ele fotografá-la. Puro luxo!
Perguntado sobre a modelo brasileira Gisele Bundchen, foi só elogios: “Gisele é a maior modelo do mundo, uma personalidade e tanto, uma profissional excepcional, defende causas e revolucionou a moda com a sua postura e engajamento, um exemplo a ser seguido”. O trabalho de Uféras hoje faz parte de importantes coleções, como a Maison Européenne de la Photographie, em Paris; a Biblioteca Nacional da França; a National Gallery de Londres; o Salzburg Festival na Áustria; a Henkel Collection, na Alemanha e a House of Photography, em Moscou.
Além de toda a riqueza da bagagem cultural deste grande artista parisiense da fotografia, o que seduz é o jeito despojado e enigmático de ser e de contar sobre as incansáveis experiências e viagens pelos palcos dos espetáculos e da alta-costura mundo afora.
SITE: gerarduferas.com
Fotografia por Giselle Padoin Curadora e pesquisadora de moda | Matéria publicada na edição 102 da Revista Versatille