Exposição no CCBB: desvendamos a fotografia surrealista de Man Ray

Com mais de 250 obras de Man Ray, criador da fotografia surrealista, exposição no CCBB de São Paulo é um passeio imperdível

 

Apesar de ser norte-americano da Filadélfia, com passagem marcante por uma Nova York dadaísta, a Paris surrealista foi a verdadeira festa do artista Man Ray (1890-1976). Afinal, foi na chamada Cidade Luz que ele instalou seu ateliê sinônimo de vanguarda, onde revolucionou a fotografia, fazendo-a submergir no sonho surrealista.

 

Até o fim de outubro, o Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo abriga a maior exposição de trabalhos dele já feita no País. Produzida pela Artepadilla, reúne a impressionante marca de 255 obras de Man Ray no charmoso edifício localizado na histórica região central da capital paulista.

 

Depois será a vez de os mineiros entrarem em contato com Man Ray, já que a exposição seguirá para o CCBB-BH, onde poderá ser visitada entre 11 de dezembro de 2019 e 17 de fevereiro de 2020, também com entrada gratuita.

 

 

Multifacetado, Man Ray foi não apenas fotógrafo, mas também pintor, escultor e cineasta, trabalhos que foram frutos de uma mente criativa em constante atividade.

 

Nascido na Filadélfia, o jovem rumou para Nova York com a ambição de se tornar artista, matriculando-se na Social Center Academy of Art. Nessa época, conheceu o mestre inspirador francês Marcel Duchamp (1887-1968), ícone do movimento dadaísta.

 

A influência foi tão grande que, em 1921, resolveu cruzar o Atlântico rumo a Paris, onde teve vida agitada e produtiva até o cerco nazista à cidade, 19 anos mais tarde.

 

Nesse meio tempo, enquanto fazia fotos publicitárias e jornalísticas para ganhar o pão de cada dia, Ray buscava na solidão de seu laboratório a criação de uma imagem que transcendesse o real em busca do sonho: a fotografia surrealista.

 

Com a Segunda Guerra Mundial, fugiu das tropas de Hitler, retornando a seu país natal, onde, com prontidão, foi contratado para retratar celebridades em Hollywood. Com a vitória dos aliados, retornou a Paris, assim como outros in-telectuais do mundo todo. Em 1961, viveu a glória de receber a Medalha de Ouro da Bienal de Fotografia de Veneza.

 

 

Um artista de tamanha envergadura deve se refletir no público da exposição. “Temos uma expectativa de atingir pelo menos 180 mil visitantes”, diz Claudio Mattos, gerente geral do CCBB-SP. “Man Ray foi um artista multidisciplinar que viveu a efervescência cultural de Paris”, reforça. “Sua obra apresentada nessa exposição vai despertar a curiosidade do público brasileiro para sua trajetória.”

 

A mostra traz objetos, vídeos, fotografias e serigrafias de tamanhos variados – de 40×30 a 130x90cm. Obras que foram desenvolvidas durante os anos em que o artista morou em Paris, entre 1921 e 1940, período em que viveu o apogeu de sua criatividade. A exposição não deve ser vista só pelos paulistanos. “Recebemos muitos visitantes de todas as partes do Brasil, e até mesmo do mundo, já que o CCBB São Paulo está na rota do turismo na região central da capital paulista”, lembra Mattos.

 

A curadora Emmanuelle de l’Ecotais, grande especialista na obra de Man Ray e autora do Catálogo Raisonée, conta que optou por dividir a exposição em duas partes. A primeira é focada na fotografia apresentada como um instrumento que reproduz a realidade. Nesta primeira etapa, o público ficará diante dos famosos retratos produzidos por Ray em seu ateliê, bem como os ensaios realizados para a grife de Paul Poiret (1879-1944), um dos nomes históricos da moda francesa, e ainda suas incursões no fotojornalismo.

 

 

A segunda parte da mostra dedica-se àquilo que tornou Man Ray uma lenda: a criação da fotografia surrealista. Esta foi resultado dos experimentos em seu laboratório, onde manipulava as imagens capturadas do real com superposições e solarizações, criando suas “rayografias”, como nomeou, fazendo referência ao próprio sobrenome. Assim, quebrou com a tradição do real na fotografia, abrindo para ela o caminho rumo ao onírico.

 

Para melhor compreensão da obra do artista, a exposição apresenta ainda ao público os contextos sociocultural e histórico em que foi criada: a mesma Paris em ebulição re-gistrada pelo escritor norte-americano Ernest Hemingway (1899-1961) no livro Paris É uma Festa, uma cidade repleta de artistas geniais de diferentes nacionalidades que se frequentavam mutuamente, não só no plano artístico como também no íntimo.

 

Uma exposição dessa envergadura sobre Man Ray não poderia deixar de dar espaço à sua grande musa, Kiki de Montparnasse. Na verdade, Alice Ernestine Prin (1901-1953), modelo, atriz, cantora e pintora francesa que se tor-nou lenda do bairro parisiense que era point de artistas e intelectuais nas primeiras décadas do século passado.

 

 

Nascida pobre, no interior da França, Alice foi aos 12 anos morar com a mãe em Paris. Trabalhou em lojas e padarias até começar, ainda adolescente, a posar nua para pintores e escultores da época. Assim, tornou-se Kiki e assumiu a arte como estilo de vida, além de Man Ray como seu grande amante.

 

Com o tempo, Kiki tornou-se pintora também, profissão que exerceu até sua morte, ainda hoje envolta em maledicências: uma abrupta queda de seu apartamento em Montparnasse, que muitos afirmam ser fruto de um mergulho profundo no álcool e nas drogas.

 

Além de passar rapidamente por essa importante personagem na vida de Ray, a exposição também apresenta raros filmes assinados por ele, no bojo da interatividade, que ainda inclui a possibilidade de conhecer um laboratório fotográfico e as técnicas utilizadas para a criação da fotografia surrealista.

 

Emmanuelle de l’Ecotais define Ray como “um faz-tudo genial”, sem medo de cometer exagero. “Após tornar-se rapidamente fotógrafo profissional, sua obra oscila, de maneira contínua, entre o trabalho de encomenda – o retrato, a moda – , de um lado, e o desejo de realizar uma ‘obra artística’, do outro”, recorda. A curadora recupera a frase que Ray usou para definir o que seria aquele que produz arte: “o artista é um ser privilegiado capaz de livrar-se de todas as restrições sociais, cujo objetivo deveria ser alcançar a liberdade e o prazer”.

 

*Por Miguel Arcanjo Prado 

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