Como a franco-britânica Catherine Petit, à frente de nomes como Moët Hennessy, enxerga sua vida e carreira no Brasil

Formada em administração de empresas pela École Supérieure de Commerce de Paris, a executiva desembarcou em solo brasileiro no começo dos anos 2000

Catherine Petit (Foto: Divulgação)

Caso eu não notasse o sotaque, ou até mesmo não soubesse, talvez, Catherine Petit, diretora-geral da Moët Hennessy e da Chandon Brasil, até passaria como uma brasileira, país que considera o segundo em seu coração, muito por seus trejeitos e sua postura em relação à vida.

 

Formada em administração de empresas pela École Supérieure de Commerce de Paris, desembarcou em nosso país, na cidade de São Paulo, no começo dos anos 2000, quando o Brasil ganhava os holofotes com expectativas de um futuro promissor. Trabalhava, naquele momento, numa seguradora, mas, em 2007, foi para a sua atual “casa”: a francesa Moët Hennessy, do grupo LVMH. Naquele momento, ocupava uma posição de desenvolvedora de negócios, cuidando, além do território brasileiro, do continente africano e do Oriente Médio.

 

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Foram anos entre muitas viagens, das quais sempre retornou ao seu lar, o Brasil, até voltar para a França, em 2016, o que foi, para ela, uma “reexpatriação”: “Tudo tinha mudado. Meu filho nasceu no Brasil e viu a Torre Eiffel com 14 anos, pela primeira vez. Naquele período, eu tive muitas saudades do país. Eu vi tudo isso de longe e tive ʻraivaʼ porque, enquanto estava de volta à França, escutei muito que o Brasil e a América Latina não serviam mais”.

 

Em março de 2020, em plena pandemia, ela retornou ao país para reestrututar a Moët Hennessy e a Chandon Brasil, trabalho que vem sendo feito com louvor desde então. Confira, na sequência, a conversa com Catherine Petit.

 

Infinita 18, da Glenmorangie

 

Versatille: Como foi o seu retorno ao Brasil?
Catherine Petit: Eu retornei em 2020. Para uma verdadeira reestruturação das marcas, tivemos que começar do zero. Eu cheguei junto com a pandemia, fiquei meses trancada, sem conhecer as pessoas, o que me deu tempo de conhecer melhor o momento da empresa, qual era a estratégia e pensar numa forma possível de começar a implementar as mudanças.

 

V: Então, nesses últimos quatro anos, muita coisa mudou na Moët Hennessy?
CP: Quase que foram só transformações. Recentemente a gente estruturou uma apresentação interna para o RH que fica baseado na França e pude perceber que muita coisa mudou: pessoas, processos, automatização, distribuição, entre outros. Na Chandon Brasil também fizemos muitas mudanças na marca, uma maior comunicação sobre a sustentabilidade, que é algo que sempre foi feito nas instalações e no cultivo. Desde a primeira vez em que eu fui lá, percebi isso, mas faltava comunicar. As marcas também passaram por um processo de reconstrução. São mais de 20 marcas no país atualmente.

 

V: O que a atraiu e fez você permanecer no mercado de bebidas alcoólicas?
CP: Eu gosto do produto. Sou do sudoeste da França e fui criada com os vinhos de Bordeaux. Meu pai era apaixonado por vinho, e o francês tem em sua cultura os vinhos e destilados. Do que eu gosto, mais que o produto em si, é que as bebidas são vinculadas a celebrações e aos momentos positivos, algo que me atrai, afinal eu sou positiva e gosto de celebrar. O que mais me fascinou, na Moët Hennessy, são as marcas, construções de histórias centenárias desde a fundação. Eu fico muito impressionada, e elas me emocionam até hoje. É uma espécie de paixão, então, aqui [no escritório da empresa, em São Paulo], a gente fala, rindo: “Talvez, se vendêssemos pneus, pararíamos mais cedo de trabalhar”. A gente fica exausta, mas é muito gostoso.

 

V: Em algum momento, você se especializou no segmento?
CP: Nós temos treinamentos dentro da empresa, para poder aprender sobre as marcas e os produtos, algo que eu fiz no decorrer da minha carreira. Também temos a LVMH House, que é uma casa de treinamento sobre construção de marca e conceito de luxo.

 

V: O que o Brasil tem em comum com a cultura da Moët Hennessy?
CP: Todas as marcas são relacionadas com celebrações e com aproveitar a vida. Tem muito a ver com otimismo, é sobre ver o copo meio cheio. O Davide [Marcovitch, presidente da LVMW para América Latina, Caribe e África] sempre fala: somos vendedores de felicidade engarrafada.

 

V: É possível ter uma rotina na sua posição?
CP: É o que eu amo, mas é o que está me “matando”. Além do dia a dia, das reuniões, das responsabilidades, tem uma posição de representação muito forte. Não são apenas eventos, tem os clientes, e o brasileiro gosta muito de ser prestigiado. Então eu tenho esse carinho, que eu amo, mas é algo que acaba me “matando”. Nesse período de festas, eu nem olho mais a minha agenda, eu fico desesperada [risos]. Mas isso faz parte da minha personalidade: eu gosto de encontrar gente, de ir a festas. Ainda bem que eu gosto, porque, caso não, não daria certo. Eu entendo a cultura, então acabo sentindo o que devo fazer ou não. Isso também faz parte da minha educação e dos meus valores.

 

V: Muito se fala sobre e as pesquisas confirmam: a diminuição do consumo de álcool, especialmente da geração Z. Como driblar isso, sendo uma empresa de bebidas alcoólicas?
CP: É algo comumente abordado, o mercado está levando muito a sério isso. Primeiro, temos essa ressaca da pandemia. Se você acompanhar os resultados das empresas, muitas estão sentindo isso – o que anda junto com as crises e as guerras, é claro. Atravessamos dois anos com muita vontade de celebrar. De repente, isso parou, e o bolso do consumidor ficou mais vazio, então teve um retrocesso. Nos novos valores, temos a sustentabilidade, que também abrange o consumo responsável. Os governos estão impondo mais leis e alertas sobre o consumo de álcool. As gerações mais novas não estão apegadas às bebidas alcoólicas como lazer, o que é um fenômeno global. Eu vejo até pelo meu filho, que é dessa geração, ele e os amigos têm uma frequência bem mais baixa, o que era bem diferente na minha época. É um desafio e algo que estamos falando já há alguns anos. Uma nova era e nova forma de enxergar e apresentar os nossos produtos. Falando da Moët Hennessy, são produtos que se posicionam no mercado de alto padrão, visamos mais à qualidade do que à quantidade e nos preocupamos também com as composições, no sentido de menos açúcar e até de menos álcool.

 

V: O que podemos esperar da Moët Hennessy para os próximos anos, no Brasil?
CP: Falando apenas de borbulhas, nós “voltamos”, somos líderes e continuamos crescendo [são seis marcas presentes no mercado brasileiro]. Temos o portfólio de vinhos e estamos apostando na categoria rosés da Provence, que é muito pequena no país. É a mesma lógica de espumante e champanhe: você tem o rosé e o rosé da Provence, que é uma apelação. Estamos há dois anos com o Whispering Angel, mas queremos trazer outros rótulos, para mostrar a versatilidade desse vinho. Também temos o Minuty, que o grupo comprou recentemente. O brasileiro viaja muito e é familiarizado com ambas as marcas. Então é uma grande aposta. O grande desafio para nós são os destilados, porque por um tempo só trabalhávamos com a Belvedere [vodca], e agora temos o Glenmorangie, que é um uísque single malt – uma categoria muito especial, que tem um consumidor que é fiel a esse nível de bebida.

 

V: O Brasil é um mercado relevante para vocês?
CP: Essa é uma pergunta ótima, porque eu acho que a proporção com o resto do mundo é pequena, mas a tendência é de crescer, em volume, sim, mas principalmente em valor. Enquanto isso, a realidade do resto do mundo é decrescente. O que estou tentando sinalizar é que aqui é um país onde temos que investir: a China está numa crise, os EUA também, não podemos depender tanto, e a Europa, mesmo caso. Então a América Latina e a África são dois mercados que estão crescendo. A nossa ambição é sermos mais representativos. Hoje já fizemos movimentos para aumentar o valor, temos distribuições focadas, somos bem seletivos na hora de posicionar as marcas no mercado. Tem toda uma customização que auxiliou a valorizar o nosso portfólio.

 

Por Giulianna Iodice | Matéria publicada na edição 137 da Versatille

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