Aos 61, Madonna volta ao pop (que ajudou a definir) com ‘Madame X’

Com "Madame X", cantora se reinventa mais uma vez ao 61 anos e lança um dos melhores trabalhos de suas quase quatro décadas de carreira

Nossa? Ainda? Ela está com quantos anos? Essas são algumas das perguntas que surgem quando Madonna lança disco. Muita gente, infelizmente, adoraria que ela tivesse se apo – sentado ou sossegado o facho (será que desejam o mesmo para Mick Jagger, Paul McCartney ou Elton John? Arrã, sei).

 

Para desespero de quem torce contra – e alegria dos apreciadores de pop de primeira qualidade – a cantora mostrou com Madame X, seu álbum mais recente, que, aos 61 anos de idade e 36 de carreira, não passa nem perto de perder a majestade. Continua na ativa, cantando, dançando e, acima de tudo, lutando. Permanecer talvez tenha sido sua principal maneira de incomodar, de seguir na contramão.

 

Após as primeiras audições da imprensa, foi difícil encontrar quem discordasse da ideia de que este era seu trabalho “mais bizarro” nas duas últimas décadas. Com o lançamento, porém, as resenhas foram positivas e a maioria esmagadora das revistas especializadas, que nem sempre são generosas com a rainha, simplesmente se rendeu.  O público, idem: no iTunes, ficou em primeiro lugar em mais de 60 países e alcançou o #1 na parada Billboard 200 – um feito que ela não conseguia havia 11 anos.

 

 

Poderia ser só mais um número se este não tivesse dado a ela o título de segunda mulher com a maior quantidade de discos em #1 da história. Na briga pelo topo ao lado de jovens nomes do pop, como Billie Eilish, Madame X foi lançado em todas as mídias possíveis. Mesmo. Até em K-7, formato considerado decadente e que, com isso, ganhou novo fôlego. Depois de flertar sem pudor com a dance music, o hip hop e o eletrônico, sempre se mantendo por dentro do que era tendência, a artista viu que seus trabalhos não vinham tendo a recepção esperada nem pelos fãs, nem pela mídia especializada que, não raras vezes, a acusou de ceder ao marketing.

 

Se no estúdio a inspiração parecia ter fugido para dar espaço a uma tentativa de conquistar novas gerações e, consequentemente, o rádio (que não estava nem aí para ela e chegou a considerá-la velha demais), foi diante de multidões ao redor do mundo que pareceu ter ido pouco a pouco se encontrando – mesmo álbuns menores, como Hard Candy, resultaram em shows sensacionais. É grande, portanto, a expectativa quanto ao que virá quando Madame X ganhar os palcos.

 

O álbum nasceu em Lisboa, cidade para onde se mudou para realizar o sonho de um dos seis filhos, David. O garoto quer se tornar jogador de futebol e Portugal tem boas escolas do esporte, pouco tradicional nos Estados Unidos. Ela sequer fazia planos para um álbum, e a vida pacata da capital portuguesa, que antes tinha provocado encantamento, agora parecia tê-la deixado entediada. Nem amigos tinha ali, contou mais tarde.  A solidão durou pouco. Pelo Instagram, sua rede social favorita, vimos uma mãe, dona de casa e artista temporariamente em férias se tornando serelepe, começando a se jogar na noite, a tomar bons drinques e a se aproximar de músicos anônimos.

 

Exatamente aqui, nesse berço da diversidade, que estão as chaves para entender a grandiosidade desse retorno. Onde tudo começou?

 

DESVENDANDO MADAME X 

 

No fado português. Ouvindo ícones da música lusitana, como Amália Rodrigues, ela encontrou nesse que é um dos mais tradicionais gêneros musicais do país uma deixa para ligar para o amigo francês Mirwais Ahmadzhai. Extremamente atenta ao que acontece ao seu redor, aquela artista adormecida sabia que a arte, mais do que nunca, vinha servindo como refúgio. O mundo não passava bem e o sentimento de tristeza não poderia ser ignorado. Após terem trabalhado em algumas demos, mesmo a distância, a rainha decidiu arregaçar as mangas e começar a produzir novas canções.

 

Daí para se sentir influenciada pelo som inconfundível de Césarea Évora e pelas batucadas africanas foi um pulo. Cansada de ficar em seu casarão, Madame X assumiu sua primeira persona: a de viajante pelo mundo, mesmo sem sair propriamente de casa. Pouco a pouco, um disco grandioso (um dos mais, eu arriscaria dizer) foi nascendo. Profundo, global e esperto, este trabalho traz em si uma quantidade enorme de significados e referências que o alçaram sem grande dificuldade ao panteão dos melhores álbuns de sua carreira.

 

Madonna caprichou também no conceito e decidiu encarnar uma personagem inédita, diversa e que assume várias identidades. Chegou a encontrar jornalistas para entrevistas já usando o tapa-olho da Madame X, que ela diz que pode ser “loira ou morena, uma agente secreta, uma professora de dança, uma prisioneira, uma santa, uma prostituta…”

 

 

Essas mil facetas se refletem nas faixas do disco, que trazem tanto a batida das pistas de dança quanto a militância política. Embalada por instrumentos sofisticados como o piano e o acordeon, conta histórias sobre um mundo injusto, que ainda precisa muito de sua voz e seu otimismo pra mudar. A ousadia entra também na estrutura, porque algumas músicas são mais longas, não obedecem à linearidade do pop convencional, radiofônico. Há espaço até para a poesia, e isso prende.

 

É algo novo, vindo de alguém que há quase quarenta anos vive diante dos holofotes e passou por todo tipo de crítica e escrutínio público – nem sempre de maneira justa. Convidou para participações artistas latinos em ascensão, caso do colombiano Maluma e da brasileira Anitta. Esta última uma das mais comentadas nas redes sociais, elemento fundamental na construção de qualquer divulgação nos dias de hoje.

 

Na letra de I Rise, faixa que fecha o disco, M diz que vai se levantar. Se é uma metáfora sobre o presente, uma mensagem de resiliência, não dá para saber ao certo. O que fica é a certeza de que nesses últimos 15 anos certamente faltou algo que lhe oferecesse novas perspectivas do mundo, que sempre foi seu melhor radar. Mergulhada nessa infinitude de referências e culturas que é Portugal, Madonna entendeu que sua missão por ora está cumprida e que sua mudança de país, no fim das contas, não foi tão monótona assim.

 

 

 

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