Como é viajar por Auvergne-Rhône Alpes, na França

Três estações de esqui e uma parada estratégica em Lyon são o suficiente para apaixonar-se pela riqueza do destino

Antes mesmo de chegar à região de Auvergne-Rhône Alpes, na França, o meu imaginário já era habitado por um cenário de grandes montanhas, o Mont Blanc como protagonista e paisagens livres, repletas de árvores e vegetação, verdes no verão e cobertas de neve no inverno. Ao desembarcar em Lyon e, na sequência, seguir viagem para as montanhas, tal imagem, generalista e reduzida, se confirmou, mas a vida real revelou-se ainda mais surpreendente. 

 

Vista de Avoriaz (Divulgação)

 

Ao embarcar no voo da Air France, que conecta diretamente o Aeroporto Internacional de  São Paulo Guarulhos ao Aeroporto de Paris, Charles de Gaule – são dois voos diários –, tudo indicava, o que mais tarde se confirmou, que o trajeto seria uma etapa prazerosa. Diretamente do meu assento, da business class, percebi que o novo layout das aeronaves Boeing 777-300ER, antes mesmo de voar, garante ainda mais conforto graças a sua configuração, criada sob o conceito 3 “F”s: Full Flat, o assento vira uma cama plana, de quase 2 metros; Full Access, em que todos os passageiros têm acesso ao corredor; e Full Privacy, uma nova porta que garante a privacidade. Bem acomodada, eu me vi imersa no clima francês. Aproveitei para assistir a um filme ligado a cozinha; afinal, o meu destino era Lyon, o berço da gastronomia francesa. Olhei atentamente o menu, que tem sempre um grande chef por trás, e aproveitei um almoço em etapas, bem fresco e leve.  

 

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Após horas de sono, acordei em Paris. Com um intervalo de duas horas para o meu próximo voo, o destino certo foi o lounge da Air France, no terminal 2F, o mais novo deles. Com arquitetura impressionante e pé-direito superalto, o salão é repleto de móveis modernos e uma escadaria imponente. É todo envidraçado, com vista para a pista de voos e oferta de comidas e bebidas, espaços para ler, relaxar e se acomodar. Aqui, devo fazer um parêntese especial: a também francesa Clarins tem um espaço de SPA, com tratamentos gratuitos, que funcionam de segunda a sábado.  

 

Pela primeira vez em Lyon, a passagem de 24 horas garantiu achados na cidade que é uma opção ótima de porta de entrada para quem vai passar dias esquiando nas montanhas. Repleta de história e beleza, a cidade que abriga o estrelado Paul Bocuse, do lendário chef homônimo, falecido em 2018, também é o lar dos bouchons, restaurantes casuais que servem pratos típicos lioneses, numa atmosfera aconchegante e sem afetação. Foi justamente no histórico Le Casse Museau que fomos apresentados a especialidades como a quenelle de peixe, uma receita de 1830, e a andouillette, uma linguiça feita de miúdos de porco.  

 

Comidas típicas de Lyon no Le Casse Museau (Arquivo pessoal)

 

A catedral de Lyon tem arquitetura imponente, com fachada de estilo gótico e interior romanesco, com diversos detalhes a perder de vista – seriam necessários muitos dias para ver a fundo a beleza dos afrescos e dos detalhes. Por estar no alto, um miradouro permite olhar Lyon por cima. É bonita até num dia chuvoso, que deixou o rio com aspecto terroso – a cidade abriga o encontro dos rios Savorne e Rhône. Após descer muitas escadas e cruzar uma ponte aliás, a segunda maior cidade da França incentiva os locais e visitantes a andarem a pé , chega-se ao centro histórico, que revela, em sua configuração medieval, com pequenos becos e passagens estreitas, que existe muita história por ali.  

 

Depois de um dia longo, voltei ao hotel, Intercontinental Lyon, Hotel Dieu, um prédio histórico em que, no passado, funcionou um grande hospital – partes como a estonteante capela continuam preservados, assim como a sua Doma, e agora funcionam como um bar de coquetéis e comidas, batizado de Le Dome. Justamente o que precisava para descansar, o quarto é espaçoso, com vista para o Rhône, amplas janelas e atmosfera moderna – o design de interiores foi assinado pelo francês Jean Philippe Nuel. Na manhã seguinte, logo no café da manhã, que possui bufê amplo, contato com mais uma especialidade da cidade: o queijo cervelle de canut, uma composição de queijo branco com ervas, alho e cebola. Cervelle, em francês, é cérebro, e canut é o nome dado aos artesãos de Lyon que trabalham com seda, que no século 19, devido a tempos difíceis, passaram a substituir o hábito de comer cérebro de ovelha pelo queijo.  

 

Bar Le Dome, do hotel Dieu (Arquivo pessoal)

 

Num rápido tour gastronômico pela cidade, antes de seguir viagem, uma fromagerie se faz obrigatória. O comté, em diferentes níveis de maturação, originário do Jura, nas proximidades de Lyon, aparece na tábua, entre outros tantos, como o não tão conhecido mont d’or, da mesma região que o anterior, que vem em uma caixa de madeira. Uma prova que agrada o paladar dos fanáticos por queijos. A praluline, outro ingrediente clássico, brilha nas vitrines das boulangeries e chocolateries, presente em brioches, em pasta ou em castanhas. A Maison Pralus é a que oferece o mais tradicional. 

 

Após andar, antes de pegar a estrada, o almoço foi no novo CoCo, filial do restaurante parisiense, que tem ares cool e serve pratos de inspiração franco-italiana. A hora de dar tchau a Lyon se aproximava. O percurso, de quase quatro horas, nos levaria à primeira parada: Val Thorens, uma das estações do Les Trois Vallées, a maior área esquiável do mundo. 

 

Neve para todos os gostos 

 

Já familiar aos brasileiros, Val Thorens é um destino rico em opções de hotelaria, lazer, gastronomia e com pistas que atendem desde os iniciantes até os experientes. O meu destino era o hotel Le Fitz Roy, cinco estrelas, que me recebeu de portas abertas para a primeira noite na montanha. Com ares de um grande chalé e hospitalidade discreta, são 72 quartos no total, que acomodam de casais a famílias – a capacidade máxima são quatro hóspedes, nas dependências maiores. O ar da montanha estava dentro do quarto, mas a felicidade, antes mesmo de começar o dia de esqui, foi acordar, abrir as janelas e ver a minha varanda coberta de neve, branquíssima, sem nenhum rastro de poluição.  

 

Fachada do hotel Le Fitz Roy (Divulgação)

 

Quem esquia sabe. Um resort ski-in, ski-out é uma comodidade. Basta buscar os equipamentos nos armários, que ficam no subsolo do hotel, vestir-se e já sair para a pista. Altamente recomendado é garantir aulas com um instrutor, seja particular ou em grupo, porque eles sabem os caminhos, dão mais segurança para transitar nas pistas, especialmente para quem está começando, e ainda garantem que você saia de lá com conhecimento.  

 

À tarde, seguimos o dia no Hotel Altapura, recém-reformado, que tem grande foco na parte wellness. Após um tratamento facial, sauna e uma tentativa, apesar da falta de coragem, de aproveitar o curioso iglu, chegou a hora de desvendar um dos conceitos de restaurantes do hotel, o La Laiterie, que oferece raclettes e fondues, de diversos tipos de queijo – até mesmo de leite de cabra. 

 

A manhã seguinte reservou mais tempo de estrada, com destino à Mègeve, estação que difere em muitos aspectos de Val Thorens. Um vilarejo charmoso, com ares bem bucólicos e ruazinhas que escondem lojas de grifes, marcas locais e restaurantes. O hotel, em que muito ansiava me hospedar, era o Les Fermes de Marie. Um grande chalé, repleto de vida – e de hóspedes que se sentem em casa –, numa atmosfera discreta. Os quartos, todos com decorações distintas, esbanjam o estilo kitsch, com cores que, por um trabalho bem-feito de design de interiores, acabam ornando perfeitamente. Na minha percepção, eu diria que o local é o refúgio ideal para casais, mas muitas famílias passaram por mim, enquanto tomava um café da manhã tranquilo e observo. Não espere ser paparicado o tempo inteiro, mas vai ter suas necessidades preenchidas antes mesmo de notar que precisa de algo – e isso, para mim, é um dos melhores tipos de luxo.  

 

Vilarejo de Mègeve (Marie Bougault)

 

A noite caiu, e o destino era o badalado restaurante Indie Mountain, que se transforma em uma festa um pouco mais tarde. Com clássicos franceses e algumas revisitações, o bar au beurre meunière, acompanhado por purê de batatas, é o clássico caso de uma combinação aparentemente simples, mas que exige muita técnica, finalizada na mesa. Minha sugestão? Vá em uma mesa grande e aproveite para compartilhar pratos e, assim, provar mais. 

 

Cachorros em Avoriaz (Arquivo pessoal)

 

A terceira e última estação de esqui, Avoriaz, foi diferente de tudo o que já experimentei na minha vida. Bem no topo de uma montanha, com curvas suntuosas para chegar, esconde-se um vilarejo onde não é permitido trafegar com carros. Para os apaixonados por esportes de neve, é altamente recomendável. Além de todos os hotéis e chalés serem ski-in e out, outros esportes, como a fat bike, podem ser muito bem aproveitados. Circundada por pinheiros altíssimos, percorri quilômetros nessa bicicleta elétrica de rodas generosas, que me levou às vistas mais lindas da viagem – e que foram coroadas, por pura sorte, por uma matilha de cachorros da raça husky, que descansava ao sol.  

 

Passeio de fat bike (Arquivo pessoal)

 

Com um público bem jovem, em sua maioria europeus, que também busca se divertir no La Foulie Douce – por acaso, estava lá no dia da abertura da temporada congelada e agitada –, Avoriaz é um destino para se aventurar nas pistas. O hotel Mil8 também preserva essa energia: supermoderninho, com quartos bem grandes e vista exuberante para as montanhas. Com certeza, um destino que, apesar de não ser o primeiro na cabeça dos brasileiros, é altamente recomendável – eu voltaria, com toda certeza. Nada como uma viagem que começa como um sonho e acaba nos surpreendendo, especialmente em seu destino, antes de nos despedirmos. 

 

Pscina do Mil8 (Karine Creuset)

 

Por Giulianna Iodice | Matéria publicada na edição 134 da Versatille

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